BRASÍLIA – Cercada de suspense há semanas, a decisão da presidente Dilma Rousseff sobre o Código Florestal foi anunciada ontem ainda com certo mistério. O governo anunciou veto a 12 pontos do novo código, mas não detalhou todas as mudanças.
O resultado da tentativa de equilibrar a decisão entre a recuperação ambiental e a garantia à atividade econômica foi a reprovação de grandes proprietários de terra e de ambientalistas. Pequenos produtores, porém, ficaram aliviados com o escalonamento das obrigações de recomposição de áreas desmatadas.
Apelidada de "escadinha", uma escala de metragem para recuperação da mata em rios varia conforme o tamanho da propriedade. Para Eduardo Condoreli, assessor do sistema Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), essas mudanças não são satisfatórias.
– A primeira sensação é de frustração, por ver que o governo vai obrigar grandes propriedades a recuperar áreas maiores do que a de os pequenos produtores – reclamou Condoreli.
No grupo dos descontentes também estão os ambientalistas, que queriam o veto total da presidente Dilma Rousseff.
– O projeto do Senado já mostrava a mercantilização da natureza e não a preservação, com uso de serviços ambientais para pagar multas de desmatamento – avaliou Fernando Campos, integrante da organização não-governamental (ONG) Amigos da Terra Brasil.
Para o assessor de política agrícola e ambiente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag), Alexandre Scheifler, os vetos parciais foram positivos.
– As novas obrigações de recomposição foram justas ao tamanho das propriedades. Aqueles que podem vão contribuir mais em relação à recuperação da vegetação – considera Scheifler.
Segunda-feira, governo publica vetos e medida provisória
Recém-escolhido líder da bancada ruralista na Câmara, o deputado Homero Pereira (PSD-MT) se disse aliviado com o fato de o governo não ter cedido à pressão de ambientalistas:
– Mas ficou difícil de fazer uma análise, porque não se sabe exatamente o que foi vetado. Creio que na discussão da medida provisória será possível construir acordos.
Na segunda-feira, o governo vai publicar todos os vetos e uma medida provisória para suprir eventuais vazios legais criados com a decisão de não aceitar o texto aprovado na Câmara.
OS VETOS |
O que se sabe |
– O governo federal vetou 12 dispositivos e fez 32 modificações no texto aprovado pelo Congresso Nacional |
– Para receber crédito e financiamento, o produtor rural precisa regularizar sua propriedade no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e no Programa de Regularização Ambiental (PRA) |
Regras mantidas |
– Mínimo de área de reserva legal para propriedades na Amazônia é de 80%; no Cerrado 35%, Pampa e demais biomas 20% |
– Preservação de nascentes, manguezais, áreas úmidas e pantanais, topo de morros e encostas |
O que ainda falta explicar |
– O veto ao parágrafo que trata da recuperação e manutenção de áreas de preservação permanente em áreas urbanas e regiões metropolitanas deixou em aberto as metragens que os municípios deverão seguir |
– Valores específicos devem ser divulgados, segunda, nas medidas provisórias do governo |
O EFEITO DAS MUDANÇAS |
Quem fiscaliza |
– O Programa de Regularização Ambiental (PRA) define que a fiscalização da aplicação do Código Florestal será responsabilidade dos órgãos ligados ao Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) |
– O Sisnama é composto por órgãos ambientais da União, dos Estados e dos municípios |
– A fiscalização da aplicação do código, por meio de convênios, poderá ser feita pelos municípios. Para isso, no entanto, as prefeituras precisam ter um fiscal ambiental concursado e um técnico ambiental habilitado |
– A fiscalização da recomposição de matas ciliares e manutenção de áreas de reserva legais nas propriedades, por exemplo, é responsabilidade dos municípios onde há convênio. Se não existir convênio, a responsabilidade é do Estado |
– Averiguar possíveis intervenções em Áreas de Preservação Permanentes é tarefa do Estado |
Impacto econômico |
– Para o economista Antônio da Luz, apesar de ainda não ser possível projetar a dimensão, haverá reflexos econômicos na agropecuária dos estados do Sul. |
– Luz pondera que para estimar algum número é preciso ver os 12 vetos presidenciais e o teor da medida provisória que será enviada ao Congresso |
Imagem internacional |
– O anúncio do veto parcial divide opiniões sobre os reflexos na imagem do Brasil na Rio 20, entre os dias 20 e 22 de junho no Rio |
– Para o líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), a postura fortalece a participação na conferência por mostrar que o país consegue unir preservação ambiental e produção com uso de novas tecnologias |
– Na visão dos ambientalistas, o veto parcial contrariou a maior parte da sociedade e fará o governo chegar à conferência com discursos e práticas incompatíveis |
Repercussão política |
– Apesar de estranhar a decisão do governo de não dar detalhes dos 12 pontos vetados, o líder da bancada ruralista na Câmara, Homero Pereira (PSD-MT), mostrou-se satisfeito com as intervenções |
– O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel, avaliou que a MP a ser editada tem como objetivo dar sentido ao código e preencher o vazio legislativo do veto |
– Na oposição, o DEM que questionará no Supremo Tribunal Federal (STF) a MP. Entende que não poderia ser editada antes de o Congresso analisar os 12 vetos |
Data: 26 de maio de 2012
Veículo: Jornal de Santa Catarina
Edição: 12540
Editoria: Política
Página: 7