Dois anos depois de virar lei, a Política Nacional de Resíduos Sólidos já é avaliada como um marco do país rumo à economia verde. "Ela vai tirar o Brasil da Idade Média com relação ao lixo urbano", disse Fernando Von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak, no seminário "Política Nacional de Resíduos Sólidos: a Lei na Prática". Maior fornecedora de embalagens para alimentos, a empresa é um caso de sucesso em reciclagem: processa e reutiliza mais de 60 mil toneladas de embalagens longa vida por ano. Os investimentos anuais na cadeia de reciclagem chegam a R$ 10 milhões.
Uma pesquisa mundial feita pela Tetra Pak a cada dois anos revela que a preocupação ambiental do brasileiro é crescente, mas ele ainda não sabe o que fazer com as embalagens e espera mais informações das empresas. Uma das estratégias da companhia é aprimorar a parceria com as 600 cooperativas de catadores com as quais trabalha para reduzir a intermediação na cadeia. Sem o intermediário, o catador recebe R$ 0,37 por kg de embalagem longa vida. Com ele, R$ 0,20 por kg.
"A nossa visão de futuro é que centrais de triagem e cooperativas se tornem grandes empresas produtoras de matéria-prima de qualidade e com menor impacto ambiental para gerar renda em toda a cadeia. Temos ainda um longo caminho a trilhar, mas o resíduo sólido urbano deixará de ser problema no Brasil nesta década", afirmou Fernando Von Zuben, da Tetra Pak.
"O futuro é trabalhar com embalagens cada vez mais sustentáveis", defendeu Paulo Ricardo Rolim, diretor de Relações Socioambientais e Comunicação da Ambev. A empresa criou o Ambev Recicla, em 2011, com cinco eixos de atuação: educação ambiental, apoio às cooperativas de catadores, criação de ponto de entrega seletiva, fomento ao movimento de reciclagem e desenvolvimento de embalagens sustentáveis. O programa apoia 64 cooperativas, reúne 2.000 catadores, criou 113 pontos de entrega voluntária em 43 municípios e já reciclou na Fábrica Verde da Ambev 350 mil toneladas de vidro e 9.000 toneladas de PET. A empresa também implantou o projeto "bottle to bottle", para o desenvolvimento de tecnologia para a criação da garrafa PET 100% reciclável, e agora aposta em novas embalagens de vidro. "O Ambev Recicla é um exemplo de que estamos garantindo a logística reversa do vidro e do PET e assegurando a logística reversa da lata", afirmou Paulo Ricardo Rolim, da Ambev.
O secretário de recursos hídricos e ambiente urbano do Ministério do Meio Ambiente, Pedro Wilson Guimarães, disse que a meta não é só dobrar a capacidade de reciclagem do país de 1% para 2%, mas chegar a 20%. A primeira fase do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, que o Ministério do Meio Ambiente negocia por meio de acordos setoriais, prevê até 2014 uma redução de 22% dos resíduos recicláveis secos que vão para os lixões nas doze cidades-sede da Copa do Mundo. A segunda etapa, de 2015 a 2035, é reciclar 45%. Pedro Wilson Guimarães revelou que a ministra Izabella Teixeira já trabalha com outros setores do governo, como os ministérios da Fazenda e do Planejamento, para garantir políticas públicas de subsídios e linhas de financiamento necessárias ao desenvolvimento da cadeia de reciclagem no país.
No ano que vem está prevista a realização de uma conferência nacional de meio ambiente centrada no tema dos resíduos sólidos que vai avaliar os avanços e percalços na implantação dos acordos setoriais de logística reversa que estabelecem os mecanismos de coleta de resíduos e reprocessamento pela indústria de reciclagem. "Já fizemos muito, mas temos que fazer mais, em quantidade e qualidade. A Política Nacional de Resíduos Sólidos vai servir de espelho para outros países", disse Guimarães.
"A lei pegou. A Política Nacional de Resíduos Sólidos tem apenas dois anos, mas já se está percebendo seus efeitos", afirmou Victor Bicca, presidente do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), que coordena uma coalizão de 26 associações empresariais em torno da proposta de acordo setorial sobre a logística reversa das embalagens em geral que deverá ser apresentada ao Ministério do Meio Ambiente no começo do ano que vem. Bicca defendeu que o exemplo das latas de alumínio, que atingiram índice de reciclagem de 98% e tornaram o Brasil campeão mundial na reciclagem do material, se espalhe para outros setores.
O problema de demanda e escala ainda é um dos entraves da reciclagem apontados pelo presidente do Cempre, mas já há avanços em novas tecnologias, engajamento do setor empresarial e na liderança de governo. "O consumidor é o primeiro elo na política de logística reversa e um dos desafios é mobilizar todos os brasileiros a participarem da cadeia de reciclagem", afirmou.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3086.
Caderno Especial: Resíduos Sólidos.
Página: F1.
Jornalista: Sergio Adeodato.