Lideranças envolvidas na elaboração do projeto de lei que trata da distribuição da receita do petróleo, parcialmente vetado pela presidente Dilma Rousseff, tentarão acordo em torno da medida provisória a ser editada por ela para completar o assunto. A MP vai mudar a divisão dos recursos obtidos com os campos que ainda serão licitados pelo modelo de concessão. A MP também incluirá a destinação dos royalties futuros para educação.
O deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que foi o último relator do projeto na Câmara dos Deputados, e o senador Wellington Dias (PT-PI), autor do texto original que resultou no texto vetado pela presidente, acham que existe uma possibilidade de acordo: redistribuir de forma mais equilibrada a receita dos campos já licitados (medida vetada por Dilma), garantindo que o Rio de Janeiro e o Espírito Santo não percam a receita que receberem em 2012.
Essa fórmula foi incluída no substitutivo de Zarattini. O plenário da Câmara acabou aprovando o texto do Senado, vetado parcialmente por Dilma. Zarattini vai propor audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Casa com governadores de Estados produtores e não produtores, em busca de acordo.
Os parlamentares de Estados não produtores desembarcam hoje em Brasília sob pressão dos prefeitos (atuais e eleitos) de suas regiões, insatisfeitos com os vetos à mudança na distribuição da receita do petróleo dos campos no mar já em exploração (royalties e participação especial). Muitos também resistem à ideia de destinar para a educação todo o dinheiro que arrecadarem no futuro com o pré-sal.
Para Dias, pode haver entendimento em torno da MP, caso o objetivo seja apenas garantir que Rio e Espírito Santo não percam a receita recebida até 2012. Mas, ele avisa que, "se a decisão da presidente é não incluir as receitas das áreas já licitadas nas regras de distribuição para todos os Estados, certamente o Congresso já provou que tem maioria na Câmara e no Senado capaz de derrubar o veto". Quanto à decisão de priorizar a educação, ele acredita em amplo apoio do Congresso.
Está prevista para hoje reunião com representantes das bancadas dos 24 Estados não produtores e de municípios que se sentem prejudicados.
Mesmo os parlamentares da base que concordam, no mérito, com as decisões de Dilma, afirmam que será difícil conter a insatisfação, já que a situação dos municípios é de muita dificuldade financeira, resultado da sobrecarga de atribuições e redução dos recursos. Muitos prefeitos deixarão os cargos sem conseguir cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. E culpam o governo federal por centralizar a arrecadação com os impostos.
As maiores queixas dizem respeito ao fato de o governo federal ter promovido, no meio do ano, a desoneração do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) do setor automotivo e de eletrodomésticos, que resultou na redução do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
"O governo faz festa com recurso alheio. E está desorganizando as finanças dos municípios", diz a senadora Ana Amélia (PP-RS), que está recebendo forte pressão dos prefeitos do seu Estado para que o Congresso derrube os vetos.
Para a senadora, pode até haver uma "razão lógica e jurídica" para vetar as mudanças das regras da divisão dos recursos arrecadados com os campos já licitados (que incluem um terço dos campos do petróleo do pré-sal, que calcula-se existir no país). Também diz que é "louvável" a ideia de aplicar 100% dos royalties do petróleo em educação.
O problema, na sua opinião, é que os prefeitos necessitam de algum tipo de compensação, já que a União não compartilha o que recebe com impostos.
"A educação precisa de dinheiro, mas a saúde também precisa, a segurança pública etc. Aqui no meu Estado, 80% dos prefeitos não conseguirão fechar as contas, por causa da desoneração feita pelo governo no meio do ano do IPI, que integra a base do FPM. Muitos municípios pequenos dependem do FPM", afirma.
A líder do PSB no Senado, Lídice da Mata (BA), vice-líder do governo, vê méritos nos vetos da presidente aos dispositivos que, na visão do governo, alteravam os contratos atuais. Também concorda em aplicar 100% dos royalties futuros em educação. Mas sabe que os municípios não produtores não vão aceitar facilmente. E que a pressão para que os vetos sejam apreciados neste ano será grande.
"É uma pauta explosiva. Os prefeitos estão com a corda no pescoço. Não temos que reivindicar mexer na distribuição da arrecadação passada. Temos que reivindicar é que o governo compense as prefeituras pelas desonerações do IPI e outras medidas que reduziram os orçamentos dos municípios", afirma Lídice.
A votação de vetos presidenciais é prática rara no Congresso. Mais rara ainda é a derrubada deles. Para que isso ocorra, a maioria absoluta de deputados e de senadores, em sessão conjunta, têm de votar pela rejeição do veto. Há uma lista enorme deles aguardando votação.
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), a quem cabe convocar a sessão para apreciar vetos, pretende ouvir o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e líderes para decidir se convoca ou não sessão do Congresso. "Num assunto dessa magnitude, uma decisão dessa jamais será solitária."
Em tese, haveria votos suficientes para a derrubada dos vetos, já que, nessa questão dos royalties, o Rio e o Espírito Santo estiveram isolados.
O governo pode pressionar Sarney a não convocar, tentar unir sua base para derrubar o veto, negociar na própria MP ou começar um processo de discussão com o Congresso sobre uma repactuação federativa, que resulte em uma distribuição mais equilibrada da arrecadação tributária.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3147.
Editoria: Política.
Página: A12.
Jornalista: Raquel Ulhôa, de Brasília.