Num momento em que o aperto monetário leva à moderação geral no ciclo de expansão de crédito bancário, o segmento de empréstimos e financiamentos a Estados e municípios vive o período de maior exuberância em dez anos, fruto do afrouxamento de seus limites de endividamento, mostram estatísticas divulgadas pelo Banco Central (BC).
O estoque de crédito para os entes subnacionais registra alta de 61,7% nos 12 meses encerrados em outubro, totalizando R$ 72,742 bilhões. Enquanto isso, o crédito como um todo, considerando todas as atividades e segmentos, mostra uma alta de 14,7%, totalizando R$ 2,610 trilhões, ou 55,4% do PIB.
Taxas de crescimento dessa magnitude não eram vistas desde 2003, ainda assim numa base de crédito bem menor do que a atual. Nos 12 meses encerrados em outubro, Estados e municípios aumentaram suas dívidas bancárias em R$ 27,705 bilhões no período, absorvendo nada menos do que 8,3% da oferta de crédito feita pelas instituições financeiras no período de 12 meses encerrados em outubro.
O avanço dos entes subnacionais no mercado de crédito ocorre num período em que, para combater as pressões inflacionárias, o BC vem subindo a taxa básica de juros, movimento que se transmite pela economia, entre outros canais, pela moderação da expansão do volume de financiamentos bancários.
Os dados para os entes federados são exuberantes em qualquer tipo de comparação. Neste ano, o estoque subiu 31%, maior alta entre toda as atividades econômicas acompanhadas pelo BC.
O estoque deles também supera o crédito tomado pela União, que fechou outubro em R$ 64,936 bilhões, alta de 4,8% em 12 meses.
Em outubro de 2012, as proporções eram reversas, com o crédito para União crescendo 72% em 12 meses (R$ 61,9 bilhões), enquanto Estados e municípios apontavam alta de 24% (R$ 44,9 bilhões). Mas ambos já estavam crescendo acima da média do mercado, que avançava a 16,6%.
O aumento do endividamento dos entes federados é resultado direto de decisões do governo que liberaram os Estados a tomar dívida tanto no mercado local quanto externo para tentar impulsionar o investimento. Esse quadro começou a ser desenhado em meados de 2012, com a criação de uma linha de R$ 20 bilhões pelo BNDES.
Reportagem publicada pelo Valor no começo do mês já havia mostrado a repercussão dessa política de liberação de limites de endividamento nas captações externas. A participação dos Estados e municípios nesse mercado saiu de 8,27% em junho de 2007 para mais de 20% agora em 2013. E tais cifras não estão computadas aqui, pois é considerado, apenas, o crédito tomado no sistema financeiro nacional.
Muitos analistas econômicos não veem com bons olhos o avanço dos governos no mercado de crédito. Eles costumam chamar a atenção para o risco do chamado "crowding out", que é os governos ocuparem espaço que seria reservado ao setor privado no crédito, pressionando as taxas de juros para os demais setores da economia. No caso atual, porém, os financiamentos bancários a Estados e municípios são alimentados sobretudo com recursos aportados pelo Tesouro Nacional em suas instituições oficiais.
Consolidando o setor público – Estados, municípios e União – o saldo de crédito fechou outubro em R$ 137,678 bilhões, crescimento de 15,8% no ano e de 28,7% em 12 meses. Já o crédito para o setor privado totaliza R$ 2,472 trilhões, avanço mais modesto, de 9,9% em 2013 e de 14% em 12 meses.
Abrindo os componentes do setor privado, destaque para o avanço do crédito imobiliário, que cresce 33,2% em 12 meses findos em outubro, somando R$ 378,438 bilhões, e para o crédito rural, que avança 27,7% na mesma base de comparação, concentrando R$ 202,042 bilhões.
Com taxas bem mais moderadas, a indústria vê seu estoque de crédito avançar 9,1% em 12 meses, para R$ 492,237 bilhões, enquanto as pessoas físicas (desconsiderado financiamentos rurais e imobiliários) avança 8,7%, com estoque de R$ 755,485 bilhões. No comércio, o aumento do crédito é de 6,9% em 12 meses, para R$ 233,954 bilhões. E nos outros serviços o aumento é de 13,3%, para R$ 410,231 bilhões.
Observando-se os dados de outubro, o estoque de crédito no sistema subiu 0,5% sobre setembro, para R$ 2,610 trilhões.
Segundo o chefe do Departamento Econômico do Banco Central (Depec/BC), Tulio Maciel, a taxa de crescimento está abaixo da verificada em outros meses e o principal fator é o próprio ciclo de alta da taxa de juros, que foi elevada para 10% nesta semana.
"A elevação da taxa de juros naturalmente se traduz em custo mais elevado para o crédito e por esse canal afeta a evolução dos empréstimos e dos saldos", disse.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3395.
Editoria: Finanças.
Página: C10.
Jornalistas: Eduardo Campos e Alex Ribeiro, de Brasília.