Têxteis e moveleiras revêem investimentos

Outubro e novembro costumam ser meses em que as empresas tomam decisões estratégicas para o ano seguinte. Diante do ambiente de incerteza provocado pela crise financeira internacional, várias indústrias moveleiras e de têxteis manufaturados em Santa Catarina – Estado líder das exportações brasileiras nesses setores – estão revendo seus planos. Boa parte dos empresários colocou o pé no freio quanto à compra de novas máquinas, ampliação das instalações e contratação de trabalhadores. No ramo têxtil a estimativa é de uma retração de 10% a 20% nas exportações em 2009 e redução na oferta de vagas. Já se fala até em dar férias coletivas.

O grande vilão para as exportadoras de têxteis até então, principalmente as de manufaturados, era o real sobrevalorizado, que provocava falta de competitividade internacional. "O dólar vai, teoricamente, se restabelecer em um novo patamar, mas haverá efeito cascata da queda de consumo na economia americana, gerando sobreoferta dos grandes fornecedores mundiais, especialmente os asiáticos – China, Vietnã, Bangladesh, Turquia, Paquistão, Indonésia", analisa o presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), Ulrich Kuhn. "A conseqüência será a queda dos preços mundiais".

Kuhn afirma que é muito cedo para ter uma avaliação numérica sobre o que isso representa, mas tudo indica que a exportação brasileira de têxteis manufaturados – a que gera mais empregos no setor – vai continuar em queda, apesar do paradoxo aparente do câmbio favorável. As pequenas e médias empresas também terão dificuldades em obter financiamento às suas exportações, tais como os adiantamentos de contratos de câmbio, bastante utilizados no setor. As alternativas oferecidas não satisfazem. "Recentemente o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] abriu uma linha de crédito com juros de 15% ao ano mais spread bancário; é brincar com a seriedade alheia", comenta.

Na avaliação do presidente do Sintex, o mercado interno não tem condições de absorver os produtos que sobram com a retração das exportações das empresas têxteis e do vestuário. Em 2008, segundo os dados disponíveis até o momento, houve crescimento de 12% nas vendas do varejo em relação a 2007, e a indústria têxtil deve fechar o ano com crescimento de 4% a 5% em relação ao ano passado. A queda gradativa nas exportações vinha sendo compensada pelo crescimento do consumo brasileiro, mas isso não deve ocorrer com a mesma intensidade. Mesmo as empresas que não exportam vão ser afetadas, pois elas abastecem as grandes redes varejistas, cujas vendas, bastante alavancadas pelo crédito, devem cair.

Kuhn vislumbra para o início de 2009 a chegada do primeiro impacto concreto da crise sobre o setor: férias coletivas. Em um segundo momento haverá sobra de mão-de-obra. "Hoje, no Vale do Itajaí, faltam trabalhadores para as empresas têxteis, mas em fevereiro do próximo ano, não será este o cenário, com certeza – só não sabemos ainda com qual intensidade". O dirigente empresarial estima para 2009 uma queda de 10% a 20% nas exportações – que devem fechar em US$ 300 milhões este ano -, embora ressalve que ainda seja cedo para se ter uma previsão exata.

"Tenho conversado com empresários que importam e exportam e a maior preocupação deles não é o mercado de bolsas, e sim o dólar", diz o presidente da Federação das Associações de Micro e Pequenas Empresas de Santa Catarina (Fampesc), Cloir Dassoler. "A maioria tem contratos de exportação com valor predeterminado na moeda americana e, quando ela sobe, precisam ressarcir a diferença." Para Dassoler, a maior preocupação não é no curto prazo, e sim as conseqüências no desempenho das empresas em 2009. Ele não acredita que haja aumento no número de demissões, pois nos últimos dois anos o quadro de pessoal das empresas de pequeno porte está relativamente estabilizado.

Crédito é a palavra-chave para os pequenos empresários. O presidente da Fampesc estima uma redução de 1,5% a 2% no faturamento das empresas catarinenses de pequeno e médio porte em 2009, mas ressalva que tudo vai depender da atuação do Banco Central e das demais instituições financeiras no fomento ao crédito. Dassoler sugere que as empresas tentem desovar no mercado interno os produtos que não conseguirem exportar. Aos associados, recomenda sangue frio: "Segurem os investimentos", diz. "Não é questão de parar de fazer o que já foi planejado, mas de ter calma, pois é possível que haja retração no consumo."

"Ainda não temos uma avaliação completa do mercado, mas na Europa e nos Estados Unidos os negócios no setor reduziram bastante", diz o presidente da Câmara para o Desenvolvimento da Indústria Moveleira da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Arnaldo Huebl. "Não se sabe se o mercado realmente caiu ou se as pessoas estão se precavendo". Ele acredita que, se o dólar permanecer no patamar entre R$ 2,00 e R$ 2,20 nos próximos meses, isso pode representar uma melhora nas exportações brasileiras de móveis.

As empresas que dependem dos bancos privados para financiar suas exportações estão enfrentando dificuldades, diz o empresário. Mas ele se mostra otimista e acredita que esta crise é perfeitamente administrável pelo setor privado. Huebl enfatiza que neste momento de instabilidade é importante evitar decisões precipitadas: "Não adianta recuar demais e perder espaço no mercado internacional para concorrentes fortes como a China, a Itália e a Polônia".

Para o empresário, não há perspectiva de diminuição no número de empregados no setor moveleiro: "Os quadros já estão enxutos e chegamos a um ponto em que não dá para reduzi-los sem afetar a produção". Em 2008, conforme o levantamento mais recente, o setor moveleiro deve faturar 10% a menos que em 2007, por causa da sobrevalorização do real até agosto.

 Veículo: Jornal Valor Econômico.
Suplemento: Pequenas e Micro Empresas
Página: F2.
Jornalista: Dauro Veras, de Florianópolis
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