O governo admitiu, ontem, que parte da dívida dos municípios com a Previdência Social, que era de R$ 22,12 bilhões no fim de 2008, deveria ser expurgada porque está em desacordo com decisões judiciais superiores e/ou com mudanças da legislação. Se forem considerados, ainda, valores devidos pela Previdência a municípios que adotaram regimes previdenciários próprios, um encontro de contas reduziria a dívida em, pelo menos, R$ 6,7 milhões, admitiu a secretária da Receita Federal do Brasil, Lina Maria Vieira, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.
Lina reconheceu que esse é um levantamento ainda preliminar e que, portanto, o abatimento pode ser maior, caso o governo concorde em fazer um encontro de contas, como pedem a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e a Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Segundo ela, essa é uma decisão que não cabe apenas à Receita, órgão que passou a ser responsável pela cobrança de contribuições previdenciárias, após absorver a unidade de arrecadação do Ministério da Previdência.
Pelas contas da CNM, somando valores cobrados irregularmente e créditos dos regimes próprios, a Previdência deve às prefeituras até mais do que o valor da dívida confessada pelos prefeitos. Liquidamente, o crédito seria de R$ 3,2 bilhões, ou seja, além de não dever nada, as prefeituras ainda teriam que receber. Mas o reconhecimento de que há necessidade de abatimento já foi considerado positivo pelas entidades municipalistas.
Os possíveis descontos referem-se, entre outras questões, à decisão do Supremo Tribunal Federal de que as dívidas não cobradas pelo governo federal prescrevem em cinco anos e não em dez anos. Mas o que foi confessado pelos municípios inclui valores que já tinham dez anos de atraso quando foram objeto de autuação pelos fiscais federais, admitiu a secretária. Só em função disso, teriam de ser expurgados pelo menos R$ 2,2 bilhões, informou ela. Os créditos dos regimes previdenciários próprios dos municípios, decorrentes de contribuições recolhidas à Previdência antes da implantação desses regimes, seriam de R$ 2 bilhões. Multas e juros cobrados a maior representam R$ 1 bilhão. Por fim, Lina reconheceu que há ainda R$ 1,5 bilhão a devolver referentes à cobrança de contribuições previdenciárias de vereadores e prefeitos durante um período em que a Justiça decidiu que elas não eram obrigatórias.
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, lembrou que os prefeitos só confessaram as dívidas por pressão, pois, caso contrário, não teriam direito aos parcelamentos oferecidos. Ele alertou que esse risco voltou com a Medida Provisória 457, que abriu novo programa de parcelamento, desde que os prefeitos abram mão de contestar, na Justiça ou administrativamente, cerca de R$ 8 bilhões. Esse valor se somaria aos R$ 22,12 bilhões já confessados, na hipótese de adesão total ao novo parcelamento.
O presidente da FNP, João Paulo Lima e Silva, pediu aos senadores que ajudem os municípios a cobrar do governo a suspensão do pagamento das dívidas com a Previdência, inclusive as já parceladas. CNM e FNP querem ainda que o Legislativo altere a MP 457, de modo a substituir a taxa de juros dos novos parcelamentos – no lugar da Selic entraria a TJLP.
As duas entidades querem ainda que seja retirada a exigência de que a parcela mínima seja de 1,5% da receita corrente líquida. Essa imposição torna impraticável a parte mais atrativa do novo programa, que a possibilidade de parcelamento das dívidas em até 20 anos. Para municípios maiores, com mais receita, o prazo de pagamento não chegaria nem a dois anos, disse João Paulo Lima e Silva.
Lina Vieira ressaltou que, independentemente da questão dos débitos previdenciários, o governo pretende anunciar compensações de perdas com a queda dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), por intermédio do qual a União entrega às prefeituras parte da arrecadação do IR e do IPI. A CNM informou que, em relação ao montante originalmente previsto no orçamento federal, as novas projeções de receita indicam perda de R$ 8,1 bilhões em repasses brutos da União ao FPM.
Lina Vieira justificou que, com a crise e a desaceleração econômica, todos os entes da Federação vão arrecadar menos. Mas admitiu que também influenciam na queda do FPM as desonerações tributárias decididas pela União, unilateralmente, em relação ao IR e ao IPI.
Ontem, cerca de 700 prefeitos chegaram a Brasília para pressionar o governo a adotar medidas que compensem as cidades pelas perdas no repasse do FPM.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Editoria: Brasil.
Jornalista: Mônica Izaguirre, de Brasília.