Setor público terá de elevar superávit primário para evitar aumento da dívida

Para evitar o aumento da dívida pública como proporção do PIB, o setor público (União, Estados e municípios) terá que aumentar o esforço fiscal em 2010 e mantê-lo nos anos seguintes. Neste ano, preocupado com os efeitos da crise financeira internacional sobre a atividade econômica, o governo federal reduziu a meta de superávit primário das contas públicas de 3,8% para 2,5% do PIB. Para o período que vai de 2010 a 2012, fixou a meta em 3,3% do PIB.

No cenário projetado pelo governo, a redução do superávit primário neste ano levará a relação dívida/PIB, o principal indicador de solvência do setor público, para 39,4% do PIB ao fim de 2009. Nos próximos anos, com o retorno do superávit para 3,3% do PIB, a relação dívida/PIB cairia para 36,9% do PIB em 2010, 34% do PIB em 2011 e 31,2% do PIB em 2012. Trata-se de uma trajetória cadente, que daria ao país o conforto de ter contas públicas equilibradas.

O problema é que o cenário do governo pode estar sendo excessivamente otimista quanto ao crescimento do PIB neste e nos próximos anos. Quando mudou a meta fiscal, o governo previu expansão de 2% para a economia em 2009 – na semana passada, reviu a projeção para 1%, percentual ainda bem superior à média das expectativas do mercado, que está prevendo, segundo o Boletim Focus, queda de 0,49%. Para 2010, a expectativa oficial é de um crescimento de 4,5%; para 2011, de 5% e, para 2012, também de 5%.

O gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, está projetando taxas inferiores para o avanço do PIB entre 2009 e 2012 – respectivamente, zero, 3,5%, 4,7% e 4,7%. Este seria o seu cenário básico, mais otimista, em que as pressões inflacionárias seriam pequenas e a taxa de juros básica não teria elevação significativa em relação à média esperada para 2009. Nesse cenário, Castelo Branco acredita que a trajetória da relação dívida/PIB seria cadente – passaria de 40,7% do PIB em 2009 para 35,3% do PIB em 2012.

Há riscos a essa trajetória e um deles, na avaliação do economista-chefe da CNI, é o efeito da desvalorização do câmbio em 2008 sobre a inflação. Se isto acontecer, o Banco Central (BC) elevará a taxa básica de juros (Selic) e, assim, reduzirá o crescimento do PIB. Esse risco está sendo mitigado neste momento, na medida em que, desde o início de março, o real vem se valorizando em relação ao dólar.

De qualquer forma, Castelo Branco montou um cenário alternativo, mais pessimista, em que a economia cresceria menos entre 2009 e 2012 – respectivamente, zero, 3,5%, 3,7% e 3,7%. Neste cenário, a relação dívida/PIB também cairia, mas numa intensidade menor que a do cenário otimista – de 40,1% do PIB neste ano para 38,8% do PIB em 2012.

O alerta que o economista da CNI faz é quanto à necessidade de elevação do superávit primário em 2010 e nos anos seguintes. Oficialmente, o governo promete cumprir 3,3%, já excluindo dessa conta a contribuição de 0,5% do PIB da Petrobras para o resultado. O problema é que as despesas primárias do governo federal estão tendo forte crescimento neste ano – 12,5%, em termos reais, no primeiro trimestre, quando comparadas ao mesmo período de 2008. A receita líquida, por sua vez, recuou 6,4%, também em termos reais, entre janeiro e março.

"Em nossos dois cenários, e também no cenário do governo federal, caso a alteração da meta de superávit primário fique restrita à exclusão da Petrobras já a partir de 2010, o endividamento público voltaria a apresentar uma trajetória descendente nas projeções até 2012. Entretanto, caso não ocorra o esforço fiscal para retornar o superávit primário para 3,3% já em 2010, é possível que a trajetória do endividamento público torne-se ascendente no horizonte até 2012", diz Castelo Branco.

Na hipótese de o governo manter o superávit em 2,5% do PIB nos próximos três anos, a relação dívida/PIB chegaria, no cenário alternativo da CNI (mais pessimista) a 41,3% do PIB em 2012, 2,2 pontos percentuais acima do valor alcançado em 2008. "Embora não represente uma trajetória de crescimento explosiva, tal movimento deveria ser evitado com o aumento do esforço fiscal já em 2010. Para isso, no entanto, será preciso conter o elevado crescimento das despesas correntes que tem se verificado nos últimos anos, dado que o cenário para a arrecadação daquele período pode não se repetir", avalia o economista da CNI.

 

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Editoria: Brasil.
Jornalista: Cristiano Romero, de Brasília.