Comissão de senadores e deputados deu início ontem a entendimentos para tentar construir uma regra de distribuição dos royalties do óleo retirado do mar que – mesmo contrariando os interesses dos Estados produtores – possa ser aprovada pelo Senado e, depois, confirmada pela Câmara dos Deputados. "O projeto se tornou bicameral", afirma o relator, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB).
Em vez de fixar percentuais destinados à União, aos Estados produtores e aos não produtores, o grupo fará o trabalho inverso. Terá de calcular, na arrecadação de royalties e participação especial (PE) resultantes da exploração do petróleo em mar, os percentuais correspondentes aos seguintes valores: cerca de R$ 8,5 bilhões (mínimo que o governo federal diz precisar em 2012) para a União, entre R$ 11 bilhões e R$ 12 bilhões para os Estados produtores (aproximadamente a arrecadação do Rio com a receita do petróleo em 2011) e R$ 8 bilhões para os não produtores (que receberiam apenas cerca de R$ 1 bilhão).
"Vamos percentualizar a proposta, dizendo que R$ 8 bilhões correspondem a X% do total arrecadado, R$ 12 bilhões a Y% e assim por diante", diz Vital. A partir da fixação desses percentuais, eles serão aplicados na repartição da receita de royalties e PE dos campos hoje explorados no mar, pelo modelo de contrato de concessão (tanto localizados acima da camada de sal quanto abaixo, na pré-sal).
Essa deverá ser a única forma de repartição até 2022, segundo Vital, quando apenas os campos licitados no modelo de concessão deverão estar rendendo. As regras para a distribuição dos recursos dos royalties resultantes da exploração dos poços licitados futuramente pelo modelo de partilha de produção (pré-sal e áreas que a União pode considerar estratégicas) serão outras.
Esses "percentuais do futuro", como chamados pelo relator, ainda serão fixados, mas devem se aproximar do que propõe o projeto de lei encaminhado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no último dia do seu mandato, que tramita na Câmara dos Deputados. No caso da proposta de Lula, os percentuais são os seguintes: 25% para Estados produtores, 6% para municípios produtores, 3% para municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque, 19% para a União (destinados ao fundo social), 3% para ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas e os 44% restantes entre todos os entes da federação (22% para Estados e 22% para municípios).
As negociações entre Estados não produtores e União estão sendo feitas a partir de projeto de lei do senador Wellington Dias (PT-PI), que integra a comissão. Além dele e Vital, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) participa pelo Senado, mas ele não compareceu à reunião de ontem. Pela Câmara, fazem parte do grupo os líderes do PT, Paulo Teixeira (SP), do PMDB, Henrique Alves (RN) e da minoria, Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).
Os parlamentares do Rio de Janeiro, que rejeitam o acordo, ontem sofreram uma derrota na Câmara. O governo e deputados de Estados não produtores conseguiram evitar a votação de um parecer do deputado Fernando Jordão (PMDB-RJ) na Comissão de Minas e Energia, que preserva os ganhos de Estados e municípios produtores ou confrontantes (cujo litoral fica defronte aos campos).
Deputados de Estados não produtores e integrantes do governo telefonaram para integrantes da comissão pedindo que não comparecessem. Argumentaram que a Câmara deveria aguardar os entendimentos feitos no Senado. "Somos a favor do acordo do Senado. Está bem encaminhado. Estamos pedindo para não dar quórum hoje para esperar os entendimentos feitos lá", disse o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), defensor de uma divisão da receita que inclua a arrecadação dos campos já licitados.
"O governo quer jogar duro contra o Rio de Janeiro", disse Jordão, após a suspensão da reunião. Aliado do governador Sérgio Cabral, Jordão apresentou parecer ao projeto de Lula que preserva os ganhos do Rio com os royalties e participações especiais dos campos já licitados e atualiza as tabelas de enquadramento das alíquotas de participação especial.
Os parlamentares do Rio de Janeiro, o maior produtor e maior beneficiário da arrecadação atual com royalties e PE, esperam que a presidente Dilma Rousseff participe dos entendimentos, para que a União abra mão de uma fatia maior do seu bolo na receita do petróleo, para destinar aos não produtores, sem prejudicar Rio e Espírito Santo, outro Estado confrontante.
"Nossa esperança é a Dilma. Esperamos que ela faça o cálculo político do prejuízo que será causado ao Rio", disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
O relator do projeto no Senado é contra o envolvimento da presidente. "Espero que ela fique fora dessa discussão. Ela é gestora, juíza. Não pode sofrer pressão política nem nossa, os não produtores, nem dos produtores", disse.
Vital acredita que mostrará em seu parecer, com números, que os Estados produtores não vão perder recursos. "Vão preservar o que já ganhavam e, depois, não vão é ganhar na velocidade que ganhavam antes", afirma.
Pelo acordo feito entre Câmara e Senado, o projeto do Senado deve ser votado no dia 19. Caso não seja votado, no dia 26 será realizada a sessão do Congresso Nacional para votar o veto de Lula à Emenda Ibsen, que redistribui os royalties pelos fundos de participação e determina que União compense os Estados produtores pelas perdas.
"Se o veto for votado, será derrubado, já que os não produtores têm maioria esmagadora no Senado e na Câmara. Derrubado o veto, os não produtores vão receber R$ 16 bilhões, e não apenas R$ 8 bilhões. Se houver ações na Justiça, como se prevê, o contencioso será entre União e Estados produtores", afirma Vital.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Editoria: Política.
Jornalista: Raquel Ulhôa, de Brasília.