Queda de ICMS primário afeta 12 Estados

A crise de renda e de liquidez vivida pelo setor agropecuário desde o fim de 2004 continua a ter efeitos mais profundos sobre as contas públicas dos Estados. Ainda afetado pelo impacto do câmbio desfavorável e do elevado custo de produção registrado no campo, o setor primário tem contribuído cada vez menos com a arrecadação de ICMS nos principais Estados produtores.


Dados consolidados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), colegiado dos secretários estaduais, vinculado ao Ministério da Fazenda, apontam que 12 estados de economia influenciada pela agropecuária tiveram desempenho negativo na arrecadação de ICMS incidente sobre o setor primário até julho deste ano. Na comparação com os sete primeiros meses de 2005, a queda chegou a 13,65%. E o prejuízo à arrecadação da máquina pública estadual soma R$ 174,7 milhões.


Os mais atingidos pela retração no ICMS agropecuário até aqui foram Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Maranhão, Tocantins e Pará. Em 2005, os Estados tiveram um prejuízo de R$ 97 milhões. “Ainda estamos sob os efeitos de uma ressaca da crise agrícola”, analisa o diretor de Finanças Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Marcelo Piancastelli. “Não há outro fator que possa explicar essa anomalia”.


O recuo no recolhimento do setor primário contrasta com a elevação na arrecadação do ICMS dos setores secundário (alta de 3,9%) e terciário (mais 8,4%) sempre no mesmo período de comparação. Assim, no total do país, o recolhimento de ICMS cresceu 8,7% até julho (em relação aos mesmos sete meses de 2005), o que representou um ganho de R$ 7,6 bilhões.


O Paraná teve o pior desempenho entre todos os Estados. A arrecadação de ICMS relativo ao setor primário recuou 48,15% até julho. Em 2005, o recolhimento do tributo cresceu 3,1%, abaixo da inflação de 5,69% medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em Santa Catarina, a queda chegou a 16,95%. No Rio Grande do Sul, 16,4%. Somados, os Estados da região Sul perderam 41,3% da arrecadação de ICMS sobre o setor agropecuário – ou R$ 117,4 milhões.


Em Mato Grosso , o tombo do ICMS primário chegou a 4,9%. “A crise do setor continua a se refletir nas cidades do interior, o que nos obrigou a fazer muitos ajustes. A conta de telefone, por exemplo, caiu 70%”, relatou o governador reeleito Blairo Maggi (PPS) ao Valor. “Aprendemos a sobreviver com menos recursos e mantivemos a eficiência. E esses ganhos serão mantidos no próximo mandato”, disse. Maggi lembrou que Mato Grosso recolhe só 15% do ICMS diretamente do setor primário. O restante vem do setor de serviços.


Os efeitos negativos da redução da arrecadação do ICMS primário sobre os estados afetam os setores industriais e de serviços. Em 2005, a indústria gaúcha de máquinas agrícolas promoveu uma onda de demissões ainda não estancada. Os serviços de Mato Grosso ainda se ressentem do descompasso. “A pancada ainda não foi totalmente assimilada”, afirmou Maggi.


A relação entre produção agropecuária e arrecadação fica clara no Centro-Oeste, onde houve uma queda total de R$ 33,4 milhões (menos 6,8%) na arrecadação do setor primário. O Mato Grosso do Sul, por exemplo, ainda sofre o impacto do ressurgimento da febre aftosa. A arrecadação de ICMS sobre o setor primário, até julho, caiu 6,7% – foram R$ 16,6 milhões a menos até aqui. “Parece que o efeito da seca no Sul, o câmbio desfavorável e das dívidas do setor continuam a influenciar o fraco crescimento econômico nas regiões agrícolas”, analisa a secretária estadual de Tributação do Rio Grande do Norte e coordenadora do Confaz, Lina Vieira. Em Goiás, o recolhimento de ICMS primário encolheu 12,1% no período.


Os prejuízos da crise da agropecuária chegaram também aos Estados mais distantes das principais regiões produtoras. No Norte, a queda chegou a 21,6%. A arrecadação de ICMS primário no Tocantins, por exemplo, registrou uma perda de R$ 5,02 milhões (menos 32,5%). No Nordeste, os Estados mais influentes perderam juntos R$ 8,3 milhões no período. O recolhimento recuou 7,4% na Bahia; 30,5% no Maranhão; e 16,6% em Pernambuco, sempre considerando o ICMS sobre o setor primário.


O diretor do IPEA, Marcelo Piancastelli, lembra que a arrecadação do setor primário no ano passado foi na contramão dos demais setores em quase todos os Estados. “A arrecadação total aumentou 10% em termos reais, sobretudo por causa de energia elétrica e telecomunicações”, disse. “A agropecuária teve o pior desempenho, foi quem mais sofreu em 2005 e continua a sofrer neste ano”.


Fonte: Matéria publicada no jornal Valor Econômico, sessão Brasil, por Mauro Zanatta, página A4, nº 1612, em 9 de outubro de 2006.