ENTREVISTA LAURO BACCA, MESTRE EM ECOLOGIA
Para o biólogo e mestre em Ecologia Lauro Bacca a tragédia climática de novembro é a maior prova de que o Código Florestal Brasileiro deve prevalecer sobre o Código Ambiental catarinense. Os cursos d'água precisam ser preservados tanto na área urbana quanto na rural. Nos grandes centros, devido ao asfalto e às construções, o solo não absorve a chuva, que escoa mais rápido e se avoluma em rios e córregos. Segundo Bacca, a lei estadual, mais branda, só agrava o problema.
Jornal de Santa Catarina – Por que o senhor é contra o Código Ambiental?
Lauro Bacca – Primeiro, porque é um código mais agrícola do que ambiental. Segundo, por ter desprezado todo um trabalho realizado por técnicos de várias áreas, representantes dos agronegócios, agricultores, representantes de universidades, ambientalistas, governantes, ao longo de 2007. Era um grupo formado para discutir a proposta do Código Ambiental. O estudo foi entregue ao governador Luiz Henrique e saiu do gabinete dele esse código deturpado. Estamos montando a bomba que vai explodir em um futuro próximo.
Santa – Por que o código está causando tanta polêmica?
Bacca – A área de preservação próxima aos rios deveria ser mais discutida. A distância de 30 metros ou cinco metros, para ter algum efeito prático, tem de ser discutida em termos técnicos, e não político-eleitoreiros. As unidades de conservação estão previstas no código catarinense para serem criadas somente por lei, o que faz com que um assunto eminentemente técnico fique à mercê da discussão de políticos. Outra coisa gritante é a compensação ambiental. Hoje, se é construída uma barragem, a compensação é de 2% do valor da obra para preservação da natureza. Com código estadual, os recursos da compensação estão previstos para outros fins. Essa lei é um retrocesso.
Santa – Quais as deficiências que o senhor aponta no código?
Bacca – O código não prevê o que deve acontecer com as nascentes, encostas inclinadas, topos de morros… Quando ele prevê a preservação de área acima de 1,8 mil metros de altitude, é uma piada. No Estado inteiro temos pouquíssimos hectares acima de 1,8 mil metros, talvez três ou quatro pontos. Outra coisa escabrosa é que ignorou mangues e restingas, previstos na Constituição como patrimônios nacionais.
Santa – Os produtores rurais defendem que o código catarinense beneficia a produção agrícola. O senhor concorda?
Bacca – O código é enganoso, porque ele beneficia mais o empresariado do agronegócio. Porém, quase apanhando dos meus colegas ambientalistas, defendo que no caso de pequenos córregos, rios com até um metro de largura, 30 metros de preservação seja muito. Em Blumenau, a maioria das propriedades rurais é cortada por pequenos rios. Nesse caso, concordo que Área de Preservação Permanente (APP) seja menor, mas é preciso discutir isso tecnicamente.
Santa – Qual a sua opinião sobre a atuação do governador Luiz Henrique nesse episódio?
Bacca – Estou preocupado com o que possa estar acontecendo com o nosso governador. Sua inteligência desaparece quando o assunto é meio ambiente, bem como aflora-lhe uma arrogância ao afirmar, em entrevista à RBS TV, que "ninguém conhece o que aconteceu melhor do que eu", sobre o que houve no Morro do Baú, em novembro. É uma inaceitável irresponsabilidade, incompatível com o seu elevado cargo, ao afirmar que "o que desabou foi mata virgem", em entrevista e artigo publicados pelo Santa após a catástrofe, insistindo em ignorar os dados técnicos de especialistas, inclusive do governo.
Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 11602.
Editoria: Política.
Jornalista: Júlia Borba (julia.borba@santa.com.br).