Esperado há mais de dez anos, o fim da Desvinculação de Receitas da União (DRU), cujo projeto de emenda constitucional deverá ser promulgado pelo Congresso Nacional na semana que vem, terá efeito zero no orçamento deste ano do Ministério da Educação. De acordo com o MEC, a programação de gastos e investimentos da pasta em 2009, elaborada no ano passado, já considerava parte das receitas normalmente consumidas pela DRU, mecanismo orçamentário criado em 1994 que permite ao governo reter 20% da arrecadação sem dizer onde aplicará os recursos.
"Programamos os investimentos de 2009 acima do limite constitucional considerando o fim da DRU, que é uma expectativa nossa de longa data e significa a garantia de todas as ações planejadas", revela Romeu Caputo, diretor de articulação dos sistemas de ensino da Secretaria de Educação Básica do MEC.
Como a extinção da DRU foi aprovada, nas últimas semanas, por Câmara e Senado de forma gradativa, prevendo 12,5% de incidência este ano, 5% em 2010 e nada a partir de 2011, os cerca de R$ 4 bilhões esperados para incrementar as verbas da educação ainda em 2009 não serão concretizados, pois já foram contabilizados no orçamento em vigor, de R$ 41,6 bilhões.
"Pense no fluxo de caixa de uma empresa. Ela pode não ter uma fonte clara de recursos, mas se planeja. À medida que as fontes ficam claras, ela sabe o que fazer. E nós tínhamos esse planejamento desde 2008, quando foi ficando mais clara a possibilidade real do fim da DRU. Sabemos que queremos construir mais creches, ter mais transporte, mais material didático", completa Caputo, acrescentando que a DRU serviu como um "colchão" contra a queda da arrecadação federal neste ano, que amarga baixa de 7,83% sobre 2008.
O fim da DRU, considerado histórico pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, só terá efeito no futuro. O MEC estima engordar seu orçamento em R$ 9 bilhões por ano, podendo chegar a R$ 60 bilhões em 2010. A secretária de educação básica do Ministério, Maria do Pilar Lacerda, afirma que o programa Pró-infância terá prioridade nos aportes dos recursos adicionais. O convênio, que destina verba federal para prefeituras construírem creches, será acelerado, porque a PEC do fim da DRU também institui a obrigatoriedade da educação básica e gratuita para crianças e jovens de 4 a 17 anos até 2016 – atualmente, a Constituição exige ensino básico para a faixa dos 6 aos 14 anos.
"O MEC faz o projeto arquitetônico e entra com o dinheiro, enquanto os municípios têm que apresentar o terreno e fazer a licitação da obra. Vamos investir principalmente na construção de creches, mas, além disso, temos que continuar formando professores no Brasil Profissionalizado e manter todos os programas de transferência, que cuidam da merenda, do livro didático, de biblioteca, transporte. Os recursos vão ter que crescer para para acompanhar o crescimento das matrículas", explica Maria do Pilar.
Segundo a secretária, em 2007 e 2008 foram fechados 500 convênios do Pró-infância, de cerca de R$ 1 milhão cada. Com ajuda do fim da DRU, o MEC espera fechar 800 convênios este ano, cada um com valor individual de R$ 1,2 milhão. Tiago Lippold Radünz, coordenador-geral de infraestrutura do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão do MEC responsável pelos financiamentos, desconhece o objetivo traçado por Maria do Pilar. "Estipulamos meta de 500 novas unidades de educação infantil. Temos mais de 1.700 processos em análise, mas o percentual de aprovação gira em torno de 30% a 40%. Para superarmos a meta colocada, teremos que aumentar o índice de aprovação. Não se trata de tarefa fácil, visto a qualidade das propostas apresentadas pelas prefeituras", justifica Radünz.
O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, é ainda mais cético: "O que adianta construir belas estruturas se os municípios não têm condições de sustentar as crianças lá dentro?", questiona. Segundo Ziulkoski, o ensino obrigatório dos 4 aos 17 anos foi aprovado sem se pensar numa alternativa para financiar o crescimento da demanda.
Com uma fila de espera de 59 mil crianças sem creche, o secretário municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Schneider, faz coro, mas não abre mão dos recursos federais. "Vamos nos candidatar ao Pró-infância até março. Todo novo recurso em educação é bem-vindo, mas é preciso repensar o financiamento federal para educação infantil, que, apesar de ser o ciclo mais caro, recebe menos recursos, proporcionalmente, que o ensino médio", exemplifica Schneider.
Também animada com o fim da DRU, a secretária municipal de Educação do Rio de Janeiro, Claudia Costin, revelou os planos da cidade. "Teremos 50 creches municipais financiadas pelo MEC no Pró-infância, todas na zona oeste, região mais pobre do município."
Veículo: Valor Econômico.
Editoria: Nacional.
Jornalista: Luciano Máximo, de São Paulo.