“As áreas de risco são ocupadas porque não há alternativa”

ENTREVISTA THIAGO GALVÃO, técnico DO MINISTÉRIO DAS CIDADES

No debate de ontem em Gaspar, o governo federal enviou como representante o geógrafo Thiago Galvão, responsável pelo setor de Prevenção de Riscos da Secretaria de Programas Urbanos do Ministério das Cidades. Ele analisou a relação entre urbanização, planejamento e desastres naturais, sugeriu ações preventivas e maior envolvimento da população na tomada de decisões. Galvão destacou ainda a importância de a população conhecer o Plano Diretor do município onde mora, para cobrar do poder público o desenvolvimento sustentável. Confira trechos da entrevista ao Santa:

Jornal de Santa Catarina – O que dificulta a implantação de medidas para diminuir os impactos climáticos?

Thiago Galvão – Nossa principal dificuldade é disseminar uma política pública articulada para estados e municípios. Os desastres naturais no Brasil têm uma cultura muito ruim, que é a de resposta mais emergencial. Nossa luta é propagar uma política de gestão de risco que pressupõe conhecer o problema, ter a dimensão dele e fazer um plano de intervenção.

Santa – A busca desenfreada pelo crescimento econômico também é uma ameaça para a implantação dessas medidas de proteção ambiental?

Galvão – Acredito que o nosso maior problema não esteja vinculado a isso. Temos de ter mais fiscalização na implantação dos nossos planos diretores, obedecer o que foi definido, ter uma alternativa habitacional para populações mais precárias.

Santa – Apesar de tantos avanços tecnológicos, não seria uma contradição um Estado ainda ficar refém do clima?

Galvão – Não controlamos o tempo nem o clima. O que podemos trabalhar, de acordo com os recursos tecnológicos e humanos que temos, é melhorar o conhecimento sobre os processos destrutivos e ter um trabalho mais sério de monitoramento, de mapeamento e equipes bem treinadas, para que pelo menos possamos trabalhar com um nível de tolerância zero para mortes, quando uma ameaça se tornar mais evidente.

Santa – Nesse quesito, quais são as ações específicas do Ministério das Cidades para a região Sul do Brasil?

Galvão – Temos duas vertentes de trabalho sobre riscos para qualquer área mais vulnerável: uma seria a urbanização de favelas e a outra, mais preventiva, trabalha com planos, capacitação e projetos. Com eles, temos um diagnóstico das áreas delimitadas, com um nível de risco e um plano de obras para que se possa fazer um plano de intervenção com critérios de prioridades.

Santa – Pelos registros do Ministério das Cidades, o que ocorreu no Vale em novembro de 2008 foi realmente inédito na história do país, como dizem alguns pesquisadores?

Galvão – O fenômeno que ocorreu aqui foi atípico. O Estado de Santa Catarina não tem registro de um fato desse porte. Uma chuva dessas em qualquer cidade da Região Sudeste teria varrido a cidade ou seria pior, porque aqui não temos ainda um processo de favelização tão forte quanto lá.

Santa – Se a vulnerabilidade é cada vez maior, o que cabe ao cidadão comum? Como se prevenir?

Galvão – Tem que pressionar o governo e as instituições acadêmicas para poder participar do processo de tomada de decisões. Temos um cenário muito preocupante no Brasil, a vulnerabilidade ainda é decorrente do desconhecimento e do processo de urbanização. As áreas de risco são ocupadas porque não há alternativa habitacional. O cidadão precisa conhecer o Plano Diretor de sua cidade e exigir que seja cumprido.

Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 11787.
Editoria: Geral.
Página: 11.