O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu recomendar aos tribunais estaduais a edição de ato normativo para regulamentar a possibilidade de protesto de certidão de dívida ativa (CDA). Ao analisar um pedido de providência da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o Plenário do CNJ considerou legal a polêmica forma de cobrança, questionada pelos contribuintes em recurso repetitivo no Superior Tribunal de Justiça (STJ). E foi mais além, definindo que as custas cartorárias devem ser pagas pelo devedor, quando for quitado o débito.
Os contribuintes alegam na Justiça que o protesto, adotado por alguns Estados e municípios e pela Advocacia-Geral da União (AGU) em projeto-piloto desenvolvido no Inmetro, é uma forma de coagi-los a quitar seus débitos e que a Lei de Execuções Fiscais – Lei nº 6.830, de 1980 – já dispõe sobre as possíveis formas de cobrança de tributos. A disputa está agora nas mãos dos ministros do STJ. O ministro Luiz Fux remeteu à 1ª Seção o processo de um contribuinte paulista. O recurso chegou a entrar na pauta. Mas o julgamento foi adiado a pedido da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que resolveu se manifestar no processo.
A prática chegou a ser questionada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que também poderia levar seu caso ao STJ. Mas a entidade desistiu do processo depois de ser derrotada em segunda instância. Em abril do ano passado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) rejeitou embargos de divergência e manteve o entendimento proferido em fevereiro, que derrubou sentença obtida em 2006. Com a disputa, a Fazenda estadual decidiu paralisar os protestos e, agora, aguarda o posicionamento do STJ.
No Rio, a lei que regulamentou o protesto também é alvo de contestações. Há mandados de segurança e duas representações de inconstitucionalidade contra a Lei nº 5.351, de 15 de dezembro de 2008. Uma delas foi ajuizada pelos deputados estaduais João Pedro Campos de Andrade Figueira (DEM) e Luiz Paulo Correa da Rocha (PSDB). A outra é assinada pela Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ). Em pouco mais de um ano, cerca de mil contribuintes fluminenses já foram levados a cartório, de acordo com o procurador-assistente da dívida ativa, Davi Marques da Silva, que comemora o resultado alcançado. "Com o protesto, o índice de recuperação de créditos chegou a 5%. Com o processo de execução fiscal, gira em torno de apenas 1%", diz.
Embora a jurisprudência dos tribunais sobre o tema não seja pacífica, o CNJ é favorável à prática. Em seu voto, a conselheira Morgana Richa, relatora do caso, entendeu que não existe qualquer dispositivo legal ou regra que restrinja a possibilidade de protesto, que considerou um "instrumento apto a inibir a inadimplência do devedor, além de contribuir para a redução do número de execuções fiscais ajuizadas". Para ela, a vantagem está no valor das custas, que "são certamente inferiores às judiciais", e no fato de não haver penhora de bens, como corre nas execuções fiscais.
A redução do número de processos na fase de cumprimento ou de execução – principalmente fiscal – está entre as dez metas da Justiça para este ano, estabelecidas no 3º Encontro Nacional do Judiciário, realizado no mês de fevereiro, em São Paulo. A Meta 3 prevê a redução do acervo de execuções fiscais em pelo menos 20%. De acordo com o secretário-geral do CNJ, Rubens Curado, essa é a meta mais ousada para 2010, "que trata de um tema no qual precisamos avançar para resgatar a credibilidade do Judiciário".
Apesar da posição do CNJ, os contribuintes estão esperançosos em obter uma vitória no STJ contra a prática do protesto, considerada pelo advogado Maurício Faro, do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão Advogados, uma forma de terceirização da cobrança. "É ilegal. Está se transferindo a cobrança das dívidas para os cartórios", diz o advogado, membro da Comissão de Assuntos Tributários da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – que atua como assistente nas representações de inconstitucionalidade ajuizadas contra a Lei nº 5.351. "Mas a palavra final será do Supremo."
Faro lembra que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade contra a terceirização da cobrança de débitos fiscais. A Associação Nacional dos Procuradores de Estado (Anape) questiona a Resolução nª 33 do Senado Federal, aprovada em 2006, que autoriza Estados, Distrito Federal e municípios a repassar para instituições financeiras a arrecadação de dívida ativa. Um dos argumentos dos procuradores tem como base o artigo 132 da Constituição Federal, que garante a eles a exclusividade na representação das unidades da federação e na cobrança judicial de dívidas. Outro está na falta de previsão constitucional do Senado para regular o assunto por meio de resolução.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Editoria: Legislação & Tributos.
Jornalista: Arthur Rosa, de São Paulo.