Governo terá superávit recorde em setembro

A capitalização da Petrobras fará o governo central registrar em setembro o maior resultado primário já contabilizado em um mês, superior a R$ 17 bilhões. Esse ingresso de recursos proveniente de receita extra representará um alívio para o Tesouro, que precisa economizar R$ 46,1 bilhões nos últimos quatro meses do ano para cumprir a meta fiscal de 2010.

Em avaliação preliminar, o resultado primário de setembro pode superar R$ 25 bilhões. A projeção é feita a partir do reordenamento de ativos e passivos do Tesouro após as operações de transferências de títulos federais à Petrobras e ao BNDES, como parte da estrutura financeira da oferta de ações.

A indicação de um superávit recorde neste mês foi feita pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin, que afirmou que a operação gerará acréscimo na receita com concessões. Entre janeiro e agosto, esse tipo de receita somou apenas R$ 518,2 milhões.

Com restrições impostas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para comentar os efeitos da capitalização, Augustin se limitou a dizer que o resultado fiscal deste mês ficará acima do recorde de R$ 16,7 bilhões, de abril de 2008.

Ele comentou que, entre 1998 e 2000, a concessão da Banda B de telefonia celular proporcionou ao governo ganho de R$ 15,4 bilhões, além de R$ 9 bilhões nos anos seguintes. "Portanto, receitas de concessões são usualmente resultado primário. Não há novidade nisso", afirmou o secretário.

Em agosto, o governo central (Tesouro, Banco Central e Previdência Social) apurou superávit de R$ 4 bilhões, acima dos R$ 842,5 milhões registrados em julho. Com isso, a economia fiscal acumulada entre janeiro e agosto totalizou R$ 29,7 bilhões (1,29% do PIB), R$ 6,3 bilhões superior a igual período de 2009. Como o governo central tem que cumprir uma meta de R$ 75,8 bilhões, será preciso economizar mais da metade desse total entre setembro e dezembro.

No Congresso, consultores analisam as medidas provisórias 500 e 505, que criaram os instrumentos legais para a capitalização da Petrobras a partir da transferência de títulos da União. Em cálculo preliminar, Marcos Mendes, consultor legislativo do Senado, apurou que pode chegar a R$ 25 bilhões o excedente em caixa no Tesouro ao fim da oferta de ações da estatal.

Esse cálculo foi feito com base em cinco operações, ao término das quais o Tesouro contabiliza, aproximadamente, R$ 50 bilhões em ações da Petrobras, R$ 25 bilhões em créditos junto ao BNDES, restando R$ 25 bilhões em caixa, resultado da venda de títulos vinculados à oferta das ações. Na outra ponta, o Tesouro apura passivo de R$ 25 bilhões em papéis federais.

Nessa configuração de ativos e passivos, o BNDES ficaria com um ativo de R$ 25 bilhões em ações e um passivo em igual montante de dívida junto ao Tesouro. A Petrobras apuraria aproximadamente R$ 75 bilhões em petróleo e um passivo de igual valor em ações. Finalmente, o mercado contabilizaria R$ 25 bilhões em títulos federais.

Ao chegar a essa configuração, baseada nos instrumentos legais instituídos pelas duas medidas provisórias, Mendes conclui que a capitalização tende a gerar uma receita aparente a partir de uma dívida oculta. O consultor classifica como precária a forma de obtenção do superávit, que pode ser alcançado a partir de ganho extra gerado por uma antecipação da receita futura de petróleo.

No Tesouro, os técnicos chamam a atenção para a grande arrecadação de tributos, entre hoje e amanhã, e que fará parte do cálculo da economia fiscal. Ontem, Augustin voltou a dizer que a intenção é entregar a meta de 3,3% do PIB de superávit sem desconto dos gastos com PAC.

Secretário diz que novo repasse ao BNDES tem impacto diferente dos anteriores

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) receberá R$ 24,753 bilhões do Tesouro Nacional do limite de R$ 30 bilhões em créditos autorizados pela União por meio da medida provisória editada na segunda-feira. Os recursos serão usados para garantir a participação da BNDES Participações (BNDESPar) na oferta de ações da Petrobras. A transferência será feita por meio da emissão de Letras Financeiras do Tesouro (LFT), com vencimento em 14 de setembro de 2014.

Questionado sobre o efeito fiscal de mais um repasse para o BNDES, além dos R$ 208 bilhões feitos anteriormente mediante aumento da dívida em títulos, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, disse que o repasse de R$ 24,7 bilhões não pode ser considerado um aporte no orçamento da instituição financeira porque não representa transferência de recursos para financiamentos.

"O impacto, do ponto de vista econômico, é diferente. Uma coisa são recursos para serem injetados na economia, outro, recursos que serão imediatamente para investimento", argumentou. Falando "em tese" sobre a capitalização em cumprimento às regras de silêncio impostas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o secretário expôs que, operacionalmente, os títulos serão emitidos e transferidos ao BNDES que, imediatamente, os devolverá ao Tesouro.

"Hipoteticamente uma operação como essa poderia ser feita da seguinte maneira: há a cessão onerosa de ativos, que será paga pela empresa capitalizada no mesmo dia da liquidação [da operação]. Essa capitalização é feita em títulos, assim como a cessão onerosa, que é paga em títulos. Então, isso não tem impacto econômico igual a outros repasses para o BNDES porque esses títulos vão e voltam no mesmo dia", informou.

O secretário afirmou que o BNDES será neste ano a maior fonte de receita de dividendos da União. Dos R$ 6,7 bilhões em dividendos repassados à União somente em agosto, R$ 3 bilhões vieram do banco. Também foram transferidos R$ 1,4 bilhão em dividendos da Eletrobrás em poder do BNDES. Para este ano, o Tesouro espera receber R$ 19 bilhões em ganhos de participação acionárias nas estatais federais.

Em relação à política de câmbio, o secretário Arno Augustin afirmou que foram ampliadas as aquisições de dólares usados na compra antecipada de títulos federais da dívida externa. "O Tesouro acelerou a política de compra de moeda estrangeira, de tal forma que estamos muito próximos do montante que estamos autorizados a comprar".

Ele não forneceu o montante em moeda americana que resta a ser adquirida, sob o argumento de que a política cambial não pode ser previsível. Considerando uma dívida externa em títulos federais de US$ 7,6 bilhões, até dezembro do ano passado essas compras somavam US$ 5,6 bilhões, restando, US$ 2 bilhões.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2602.
Editoria: Geral.
Página: A3.
Jornalista: Luciana Otoni, de Brasília.