Para analistas, investimentos também serão afetados

O detalhamento dos cortes de R$ 50 bilhões não afastou a percepção de vários analistas de que o governo terá de segurar investimentos para chegar ao esforço prometido, ainda que tenha recebido alguns elogios. E, a exemplo do que ocorreu quando a cifra foi divulgada em meados de fevereiro, as medidas não levaram os economistas a mudar as apostas em relação ao ciclo de alta de juros.

O economista Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz não ter dúvidas de que os investimentos serão atingidos. Ele cita os ministérios do Turismo e das Cidades como exemplos dessa tendência. Almeida nota que, nos números divulgados ontem, o Turismo ficou com R$ 3,082 bilhões a menos do que estava previsto anteriormente. "O problema é que o orçamento total do ministério era de R$ 3,7 bilhões, dos quais R$ 2,6 bilhões se referem a investimentos."

No caso do Ministério das Cidades, o orçamento para este ano foi definido em R$ 22 bilhões, dos quais R$ 7,6 bilhões de investimentos e R$ 9,5 bilhões de transferências para o fundo de arrendamento residencial, que se referem a gastos ligados ao Minha Casa Minha Vida. Como o governo já anunciou cortes de R$ 5 bilhões no programa habitacional, parece-lhe impossível chegar ao total de R$ 8,6 bilhões de redução de gastos sem tocar nos investimentos.

Almeida também não gostou da forma de divulgação do contingenciamento, em gastos obrigatórios e discricionários por ministério. Para ficar mais claro onde serão as reduções, teria sido melhor apresentá-las pelos grupos de despesas – pessoal, juros, investimentos, outras despesas correntes e inversões financeiras, afirma ele.

Felipe Salto, da Tendências Consultoria Integrada, tem uma visão mais positiva do esforço fiscal, mas considera que o governo não vai gastar toda a verba dos investimentos previstos para este ano do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de R$ 43,6 bilhões. Ele acredita que a execução na boca do caixa vai segurar também as inversões, um dos motivos que o levam a prever o cumprimento da meta de superávit primário, de 2,9% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2010, observa, o governo executou 65% das despesas do PAC. Se esse percentual for repetido neste ano, sobram R$ 15,3 bilhões. "O anúncio foi positivo, corroborando as nossas expectativas de que a meta poderá ser cumprida. Mas faltou o anúncio de medidas de médio prazo, que não se limitem a orçamento de 2011."

Almeida é mais cético, apostando que o esforço fiscal para pagar juros ficará no máximo em 2,5% do PIB. Ele diz que as receitas do orçamento, mesmo com o corte de R$ 18 bilhões, ainda estão infladas. Almeida e Salto acreditam que a política fiscal será contracionista neste ano, mas não a ponto de mudar a trajetória prevista para os juros, dadas as fortes pressões sobre a inflação. O economista da Tendências acredita que a taxa Selic, hoje em 11,25% ao ano, terminará 2011 em 12,75%.

O economista Rafael Bistafa, da Rosenberg & Associados, observa que o contingenciamento foi feito sobre as projeções do Orçamento e não sobre os gastos efetivamente realizados em 2010. "Não haverá cortes de gastos, mas expansão a um ritmo mais fraco", diz ele, que vê a Selic em 12,5% no fim do ano.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2706.
Editoria: Brasil.
Página: A4.
Jornalistas: Sergio Lamucci , de São Paulo.