Nunca a proposta de um novo Código Florestal, que disciplina a atividade agrícola no país em relação à necessidade de preservação ambiental, esteve tão perto de ser votada – e aprovada – pelo Congresso. Marcada para os dias 3 e 4 de maio pelo presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), a votação do projeto relatado pelo deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) virou uma possibilidade concreta depois que a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, assegurou que o governo vai se empenhar para buscar consenso em torno da legislação, que mobiliza de ecologistas ao agronegócio. O ministro da Agricultura, Wagner Rossi, também entrou em campo para negociar um acordo.
O impasse que cercou o tema nos últimos três anos começou a ser desfeito neste mês, após negociações envolvendo lideranças políticas, ruralistas, sindicais e governo – representado pelo chefe da Casa Civil, Antônio Palocci. Rebelo acredita que há consenso sobre 99% das propostas – o que não tiver acordo, defende, deve ser disputado no voto, em plenário. Mais de 60 audiências públicas já foram promovidas.
– Boa vontade existe, tanto por parte do governo quanto da bancada ruralista e até dos verdes. Hoje, 100% dos produtores estão na ilegalidade – diz Rebelo.
De um lado, produtores e pequenos agricultores alegam que o código reduziria em até 24,9% a área plantada do país. O interesse econômico provocou a proeza de unir, na mesma trincheira, o agronegócio e a agricultura familiar. De outro, a comunidade científica contra-ataca: o investimento na produção de alimentos deve ser direcionado ao aumento da produtividade, com redução e desperdícios e aproveitamento melhor das áreas.
– Existe algum diálogo, sim, mas calcado na pressão e na desinformação. Onde estão as propostas do governo? – reclama o coordenador de Mudanças Climáticas e Energia do WWF Brasil, Carlos Eduardo Rittl.
Para a ONG, o país não precisa de novas fronteiras agrícolas, mas sim de eficiência e produtividade.
A Federação da Agricultura de SC (Faesc) argumenta que a legislação ambiental vigente não pegou, na prática, porque é inviável aplicá-la em todas as macrorregiões. No Estado, que tem seu próprio código, aprovado em 2009, esta legislação tornaria ilegal a atividade de 40% dos suincultores e avicultores e de 60% dos produtores de leite.
Presidente da Faesc, José Pedrozo cita estudo da Embrapa que diz que, se todas as normas fossem cumpridas à risca, restariam 29% do território nacional para a produção agropecuária e outras atividades econômicas.
OS PRINCIPAIS IMPASSES |
Anistia a multas |
– Ambientalistas discordam quanto à anistia a quem não cumpriu a lei de reserva legal, de 1965. O projeto do deputado Aldo Rebelo prevê 22 de julho de 2008 como marco legal – antes dessa data, desmatamentos ilegais não seriam punidos. Os ambientalistas admitem isentar os desmatamentos posteriores a 1994, quando foi elevada a 80% a reserva legal da Amazônia |
Moratória para novos desmatamentos |
– O projeto do código florestal prevê que, após a aprovação na Câmara e sanção presidencial, haja um período de cinco anos em que nem as derrubadas dentro da lei seriam permitidas. A proposta foi uma exigência da bancada verde, mas os ruralistas discordam da proposta. Rebelo afirmou que vai retirar a proposta |
Fim da reserva legal para propriedades de até quatro módulos |
– A proposta do substitutivo apresentado por Rebelo é uma reivindicação da agricultura familiar, mas os ambientalistas insistem em manter a exigência para qualquer propriedade. A solução alternativa, já admitida por representantes do governo federal, é incentivar economicamente a atividade de preservação por parte de agricultores familiares |
Redução das áreas de preservação nas APPs |
– Para os ambientalistas, é "inegociável" a proposta de reduzir em 50% a área de mata ciliar (de 30 metros para 15 metros), que consta no relatório. Os ambientalistas alegam que a medida teria repercussões na ocupação urbana |
O QUE ELES AINDA PEDEM |
Agricultura familiar |
– Definição clara de áreas consolidadas e quais as atividades permitidas em encostas, por exemplo |
– Para a recomposição das Áreas de Preservação Permanente (APPs) em imóveis da agricultura, redução pela metade dos limites a restaurar |
– Nas propriedades da agricultura familiar, as reservas legais seriam diminuídas pela metade, caindo de 20% para 10% da extensão total dos imóveis. As APPs seriam incluídas no cálculo e não excederiam 10% da área |
– Instituição e regulamentação de um programa prevendo pagamentos por serviços ambientais para quem preservou ou vai recuperar vegetação |
– O tratamento diferenciado previsto pelo governo seria para propriedades que se encaixam na definição de agricultura familiar e não até quatro módulos. Estariam excluídos de benefícios chácaras e sítios usados como segunda propriedade |
Agricultura Empresarial |
– Eliminação da necessidade de Áreas de Preservação Permanente (APPs) no entorno dos reservatórios artificiais (barragens ou açudes), por não serem formados por barramentos de rios e sim pela captação da água da chuva ou fontes intermitentes |
– Em relação às APPs nas margens de rios, a a reclamação é de que não há critérios científicos para delimitar. Sugere-se a manutenção como APP as matas ciliares existentes, levando em consideração cada diferente bioma, sem regra generalizada para todo o país |
Ambientalistas |
– Rejeição à redução do limite de 30 metros para 7,5 metros nas margens de rios de até 5 metros de largura |
– Impossibilidade de anistia de multas para quem desmatou de forma irregular antes de 2008, descumprindo a lei de reserva legal, que é de 1965 |
– Retirada do texto da possibilidade de compensar em um determinado estado áreas desmatadas em outros estados ou bacias hidrográficas |
– Obrigatoriedade de reserva legal também em propriedades com até quatro módulos fiscais |
Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 12201.
Editoria: Política.
Página: 7.