Sob intensa mobilização e orientação pessoal da presidente Dilma Rousseff, o governo encontrou ontem uma saída para tentar um acordo político na votação do Código Florestal, prevista para hoje na Câmara.
O Palácio do Planalto está disposto a autorizar a ocupação de até 20% das áreas de preservação (APPs) em beiras de rio para todas as propriedades até quatro módulos fiscais – de 20 a 400 hectares, segundo o município. Foi a maneira encontrada pela presidente para garantir a recuperação de matas ciliares e o "tratamento diferenciado" aos agricultores familiares, isolando médios e grandes produtores rurais dos benefícios.
A presidente Dilma reafirmou ontem, em reunião com seis ministros e os operadores políticos no Congresso, sua determinação de evitar "anistia" a desmatamentos ilegais, garantir a integridade áreas de reserva legal (80% na Amazônia, 35% no Cerrado e 20% nas demais regiões) e rejeitar a delegação de mais poderes ambientais aos Estados. "Ela não aceita perdoar quem já tinha consciência da ilegalidade do desmatamento", disse um ministro.
Em carta aberta a Dilma, o relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP), rejeitou qualquer "anistia" em seu texto. "De 'anistia' não se trata, uma vez que não há perdão, mas apenas permuta entre a infração cometida e o compromisso da regularização dos proprietários", disse. E pediu "sensibilidade, equilíbrio e espírito humanitário" para combinar preservação ambiental com os interesses da agricultura.
A ordem de Dilma é "circunscrever danos" ao governo no Congresso. A presidente afirmou aos ministros e líderes políticos que não admitirá uma derrota do governo no plenário da Câmara. Sabe dos problemas para "conquistar" os parlamentares aliados às suas convicções. Quer "preservar" o líder do PMDB, Henrique Alves (RN), do bombardeio de seus liderados, sobretudo da influente bancada ruralista. Alves é candidato à presidência da Câmara em 2012.
O líder pemedebista deu sua palavra aos deputados aliados que não votaria nenhuma iniciativa do governo antes de resolver a questão do Código Florestal. Além disso, subscreveu uma emenda para consolidar todas as plantações e criações de gado nas áreas de APP de rios. O acordo, aceito por todos os partidos da base à exceção do PT, foi rejeitado pela presidente Dilma, como informou ontem o Valor. Agora, uma "flexibilização" das regras, sem que isso signifique abrir a porta para novos desmatamentos, seria uma "solução negociada" para preservar as relações do governo em sua coalizão no Congresso.
Dilma Rousseff afirmou aos ministros e coordenadores políticos que quer "evitar questionamentos" internacionais sobre a conduta ambiental do Brasil. A presidente avalia, segundo um auxiliar, que tem compromissos a cumprir, inclusive pessoalmente. Ainda ministra da Casa Civil, Dilma liderou a delegação brasileira na Cúpula do Clima de Copenhague, onde o Brasil assumiu a meta oficial de reduzir a emissão de gases do efeito estufa em até 39% até 2020. Ao reunir a cúpula do governo para tratar do tema, a presidente avisou que a imagem do governo brasileiro no exterior já estava abalada após o anúncio do aumento no desmatamento na Amazônia em 27% nos nove meses encerrados em abril. Dilma afirmou que o somatório de duas notícias negativas – volta do desmatamento e "anistia" a desmatadores – "deterioraria" a boa imagem construída pelo país nos últimos anos.
Desde o fim da semana passada, diante do impasse e das dificuldades em se obter um acordo para votação, a presidente avocou a tarefa de definir exatamente quais parâmetros serão aceitos pelo governo na reforma do Código Florestal. No encontro de ontem, Dilma concordou em abrir a exceção às APPs de beiras de rios, mas insistiu que essas áreas sejam de 15 metros em cada margem de rio nos casos de recomposição da floresta.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2762.
Editoria: Política.
Página: A7.
Jornalistas: Mauro Zanatta e Paulo de Tarso Lyra, de Brasília