Governo quer alternativa à Emenda 29 que traga embutida fonte de recursos

A presidente Dilma Rousseff pediu ontem aos líderes de partidos aliados no Congresso que não votem a Emenda 29 – proposta de emenda constitucional que regulamenta os gastos com saúde nos três níveis de governo (federal, estaduais e municipais), tramitando na Câmara dos Deputados – e tentem encontrar uma nova fonte de recursos para o setor.

"A presidente Dilma Rousseff foi clara hoje: tem certas votações que não resolvem o problema. Então é muito melhor abrir o debate. Se você votar apenas a regulamentação da Emenda 29 sem discutir de onde virão os recursos é votar para aparecer na foto apenas", disse a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, que foi ao Congresso para negociar uma solução.

Segundo ela, esse foi o debate que a presidente fez com as centrais sindicais e líderes e presidentes de partidos políticos da base aliada em reuniões pela manhã no Palácio do Planalto. "Ficaria contraditório um esforço pela economia com o aumento do superávit e na contramão o Congresso aumentar os gastos. Tem que ter sintonia", afirmou Ideli.

A ideia do governo é tentar aprovar outro projeto na Câmara e enviá-lo ao Senado, já com a nova fonte de financiamento, que será fruto de uma "ampla discussão" com governadores e parlamentares. Algumas ideias já estão sendo debatidas, como vincular os recursos dos royalties do petróleo à saúde.

A informação causou uma reação entre deputados que elegeram a proposta como bandeira e querem votá-la neste ano. O maior foco de insatisfação foi o PMDB, partido do vice-presidente Michel Temer, que acompanhou o encontro de Dilma com os líderes dos partidos.

"Estamos com um abaixo assinado em que 65 dos 80 deputados do PMDB pedem a votação imediata da emenda. Vamos entrar em obstrução se não votar a Emenda 29. Não vamos abrir mão da nossa posição", afirmou o deputado Osmar Terra (PMDB-RS), um dos líderes no Congresso do movimento pró-Emenda 29. Ex-secretário de Saúde do Rio Grande do Sul, ele avalia que "a presidente está mal assessorada sobre o assunto": "O projeto não aumenta os gastos da União."

Para tentar conter os insatisfeitos, o Palácio do Planalto começou a traçar uma estratégia para convencer a base a adiar a votação da Emenda 29. Nos próximos dias, deve haver reunião entre os ministros Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Saúde) com deputados e senadores para discutir uma solução. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, também deve se reunir com parlamentares para explicar a situação econômica interna e externa e por que seria melhor não aprovar o projeto como está.

A cúpula do PMDB também se reuniu ontem para verificar o que fazer com os seus prováveis dissidentes. Temer chamou ontem o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), para elaborarem uma estratégia comum: colocar ministros em campo para explicar tudo o que se refere ao assunto.

Na reunião do Conselho Político, na qual Dilma e Mantega apresentaram aos líderes e dirigentes partidários da base aliada as novas medidas de enfrentamento da crise econômica, a presidente disse que, mesmo que a criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS, a nova CPMF) fosse aprovada, no âmbito da Emenda 29, a arrecadação prevista com esse novo imposto (cerca de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões) não seria suficiente para resolver os problemas da saúde.

De acordo com o Ministério da Saúde, seria necessária injeção de R$ 20 bilhões a R$ 25 bilhões. Na reunião de ontem, Dilma criticou o movimento em defesa da saúde, que, embora sempre tão combativo, agora não quer brigar para ter essa nova fonte de recursos. A presidente disse aos líderes que tentou encontrar no orçamento recursos para a saúde, mas não conseguiu.

Os líderes, apesar dos apelos, disseram que já está marcada uma data para a votação (28 de setembro) da Emenda 29 e será difícil voltar atrás. O líder do governo na Casa, Cândido Vaccarezza, chegou a pedir que Dilma faça um apelo diretamente ao presidente da Câmara, Marco Maia.

Na avaliação feita pelos líderes à presidente, o ambiente é de aprovação da Emenda 29 sem a CSS, principalmente num momento em que o governo está desonerando alguns setores da economia. Houve, no entanto, consenso em torno da necessidade de buscar nova fonte de recursos para as ações de saúde. A presidente afirmou que o problema não é só falta de recursos, mas que as deficiências na gestão já estão sendo enfrentadas. Fora isso, é necessário dinheiro mesmo.

Mas, como avaliou a presidente, não valeria a pena o governo enfrentar o Congresso para tentar aprovar um novo imposto nos moldes da CSS que ainda não seria suficiente para resolver o problema da saúde.

Dilma afirmou na reunião do conselho que o governo sofreu duas derrotas na votação da extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), em 2007. Primeiro, na votação do Senado que acabou com o chamado imposto do cheque. Depois, pela marca deixada em torno do assunto.

Além da Emenda 29, Dilma fez um apelo para os líderes não colocarem em votação a PEC 300, que fixa o piso salarial nacional para bombeiros e policiais. Segundo a presidente, a aprovação dessa PEC geraria situação de desequilíbrio muito grande. Sobre esse assunto, nem houve discussão. Os líderes concordaram que a votação não deve acontecer.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Editoria: Política.
Jornalistas: Caio Junqueira e Raquel Ulhôa, de Brasília.