"Sem barragens, nível do rio teria chegado a 14,5 metros"

Aurélio Carlos Remor, engenheiro responsável por obras das barragens no Alto Vale

A enchente de setembro deste ano reacendeu a discussão quanto à eficiência da estrutura de contenção de cheias do Vale do Itajaí. Composto por três barragens, o sistema teve a capacidade de prevenção questionada, principalmente pelo volume de água suportado nos reservatórios de Ituporanga e Taió, muito inferior ao de José Boiteux. O Santa entrevistou o ex-diretor regional do extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), Aurélio Carlos Remor, responsável por coordenar e executar as obras do órgão no Estado, entre 1963 e 1987, quando foram construídas as barragens. O engenheiro civil aposentado fala sobre a dificuldade de concluir as obras, que já naquela época esbarravam na falta de recursos, e explica por que o projeto que previa cinco ou seis barragens tirou apenas três do papel. Remor ainda garante que, sem as barragens, a cheia deste ano, em Blumenau, teria sido muito pior.

Jornal de Santa Catarina – Como se deu a construção das barragens no Vale do Itajaí?

Aurélio Carlos Remor – Fui diretor regional do DNOS entre 1963 e 1987. Passei por períodos complicados, como as enchentes de 1983 e 1984. Fizemos a primeira barragem em Taió, que entrou em operação em 1973, depois a de Ituporanga, e por último a maior delas, em José Boiteux. Tínhamos um projeto global, mas com poucos recursos. Em José Boiteux, apesar dos entraves para desapropriar as áreas indígenas, concluímos a construção com facilidade. Em Taió, enfrentamos problemas relacionados à desapropriação de terrenos. O que ocorreu também em Ituporanga, onde tivemos que desapropriar dois cemitérios e negociar cada túmulo com os familiares.

Santa – Por que a estrutura de José Boiteux é a maior?

Remor – Porque ela tinha uma bacia de acumulação maior. Levamos mais de 10 anos para conseguir concluí-la. Como tínhamos pouco dinheiro, fazíamos aos poucos.

Santa – O DNOS queria construir três barragens ou mais?

Remor – O projeto previa cinco ou seis barragens. Mas construímos as três atuais e acabou o dinheiro, por isso paramos.

Santa – Naquela época, acreditava-se que três barragens poderiam conter as cheias?

Remor – Com as três barragens, controlamos grande parte da água que escoa para Blumenau, por exemplo. Se nesta última enchente, o rio passou dos 12 metros, sem as estruturas poderia chegar a 14,5 metros. Sabemos que não resolve o problema, mas ajuda.

Santa – Além das barragens, foram cogitadas mais alternativas para conter cheias?

Remor – Fizemos um belo projeto para construir um canal direto em que a água desceria de Blumenau até Balneário Piçarras, evitando chegar em Itajaí. Mas este sistema somente seria ativado quando houvesse enchente. Em caso de o nível estar normal, o local seria fechado. Porém, não deu certo por problemas técnicos. Teríamos que envolver também a BR-101, e a proposta não saiu do papel.

Santa – Especialistas afirmam que os deslizamentos na margem esquerda, em Blumenau, ocorrem devido a obras de dragagem feitas pelo DNOS. Na época, foram consideradas as consequências do trabalho?

Remor – Os desbarrancamentos são consequência da enchente. É assim mesmo. Fizemos na época um grande trabalho de limpeza. Contratamos uma empresa gaúcha que fez o trabalho até uma parte, mas depois a obra parou por falta de recursos.

Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 12333.
Editoria: Geral.
Página: 14.
Jornalista: Ânderson Silva (anderson.silva@santa.com.br).