Consumidor tem papel fundamental

Peça chave na cadeia de reciclagem, o consumidor deve passar a ser cada vez mais questionado a respeito de sua responsabilidade, conforme estabelecida pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Os acordos setoriais entre empresas e governo caminham para soluções de coleta de lixo que dependem da conscientização do consumidor e propõem um choque de educação ambiental no país. As entidades reunidas em torno da coalizão do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre) já têm o compromisso de todo o varejo para campanhas de mobilização. A ideia é ensinar desde a separação dos resíduos até mudanças de hábito.

Ainda não há estimativa de custo, mas há a convicção de que as empresas têm mais capacidade que o governo para pilotar a primeira grande campanha nacional de educação ambiental. Entidades que representam consumidores aprovam, mas apontam gargalos que precisam ser contemplados.

"Se não houver negociação articulada entre vários atores sociais, passando pela educação do consumidor, o investimento do reciclador e a capacitação das empresas que usam matéria reciclável, o plano não avançará", diz Hélio Mattar, presidente do Instituto Akatu, que defende o consumo consciente para um futuro sustentável.

"Algumas empresas pensam em transferir o custo da coleta do lixo para o consumidor, mas ele não está disposto a pagar mais. Nem todos os fabricantes alertam sobre o manuseio dos produtos. Mas é preciso também chegar a um ponto de equilíbrio de consumo. Há um aumento de descarte porque artigos como celulares têm um marketing agressivo para a troca por modelos mais novos, enquanto outros produtos têm obsolescência programada", afirma Patrícia Guarnieri, da UNb.

Saídas para o problema são apontadas no Plano de Ação em Produção e Consumo Sustentáveis, lançado em novembro de 2011 pelo governo federal como parte do compromisso assumido pelo país com a Organização das Nações Unidas, em 2007, no Processo de Marrakesh. O PPCS, elaborado sob a coordenação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e do Departamento de Assuntos Econômicos da ONU, faz parte de um movimento global por um modelo econômico e social mais sustentável. No Brasil deve ser implantado em quatro anos e tem seis prioridades: educação para o consumo responsável, compras públicas sustentáveis, agenda ambiental na administração pública, aumento da reciclagem, varejo sustentável e construções sustentáveis.

Um estudo do Akatu apontou um exemplo da necessidade de mudança nos padrões de consumo. O impacto do descarte de uma família de quatro pessoas, ao longo dos 73 anos de expectativa de vida do brasileiro, implicaria a construção de três apartamentos de 50 m2 com três metros de pé direito para armazenar todo o lixo produzido por ela. Em uma cidade como São Paulo, com 17 milhões de habitantes, seria preciso construir 850 mil prédios de dez andares com dois apartamentos de 50 m2 por andar para guardar o lixo.

Gabriela Vuolo, da coordenação de mobilização do Instituto Alana, entidade preocupada com o consumismo infantil e os impactos da publicidade nas crianças, alerta que pensar em educação ambiental hoje para os adultos de amanhã implica cuidados que nem sempre estão sendo levados em conta nas negociações setoriais com o Ministério do Meio Ambiente. Criança, diz ela, não é para ser enxergada como consumidor. "Jogar na criança a responsabilidade da educação ambiental, embora ela também deva ser educada, parte de uma premissa equivocada se ela for encarada como consumidora", afirma Gabriela Vuolo.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3086.
Caderno Especial: Resíduos Sólidos.
Página: F5.
Jornalista: Paulo Vasconcellos.