Em mais um caso de negociação mal conduzida pelo Palácio do Planalto, a Câmara dos Deputados aprovou, ontem à noite, projeto de lei do Senado que redistribui a renda do petróleo – royalties e participação especial (PE) – extraído dos campos já licitados. As concessões feitas pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator do projeto na Câmara, não foram suficientes para garantir apoio ao seu substitutivo. Numa votação surpreendente, o plenário da Câmara acabou aprovando o texto base do Senado, por 286 votos a favor e 124 contra. O projeto vai agora à sanção e cabe à presidente Dilma Rousseff decidir vetar ou não. Logo após a sessão, deputados fluminenses iniciaram pedidos de veto.
Foi mais uma vitória dos representantes de Estados e municípios não produtores de petróleo, que querem aumentar de forma imediata sua parcela na riqueza do produto e não aceitam que o dinheiro seja carimbado para a educação, como defende a presidente.
Durante as negociações em torno do projeto, houve enfrentamento entre o presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), e o Palácio do Planalto. O deputado criticou a interferência do governo nas articulações. "Foi uma demonstração da vitalidade do Parlamento brasileiro", afirmou Maia, depois da sessão.
A primeira reação vinda do Palácio do Planalto é que não há como fazer veto parcial e que o Congresso terá que arcar com o ônus de tirar dinheiro da educação e dos Estados produtores.
Nos últimos dias, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, foi eleito o principal interlocutor do Planalto em defesa de uma proposta que destinasse todo o recurso dos royalties para a educação e não alterasse a distribuição dos campos já licitados.
Zarattini não aceitou o pedido do governo para mexer apenas nos recursos futuros, dos campos a serem licitados. Mas, para atender em parte ao Planalto, aumentou os recursos para o setor da educação em cerca de R$ 15 bilhões, já a partir do ano que vem. Toda a verba da participação especial da União iria para a educação (a parte de royalties seria destinada à defesa e à ciência e tecnologia), assim como todo o recurso destinado a Estados e municípios (royalties e participação especial), por meio dos fundos especiais, distribuídos pelos critérios dos fundos de participação dos Estados (FPE) e dos municípios (FPM). O petista também negociou com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e concordou em aumentar os recursos para os Estados produtores, reduzindo os dos municípios.
Um dos principais defensores, no plenário, da preferência ao projeto do Senado foi Sílvio Costa (PTB-PE). "Esse projeto [do Zarattini] não agrada ninguém", disse. O texto do Senado foi aprovado em outubro de 2011. É de autoria do senador Wellington Dias (PT-PI) e o relator foi o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB). Assim como o substitutivo de Zarattini, ele altera a distribuição de royalties e PE de todo o petróleo localizado no mar, inclusive dos campos já licitados.
Pelo texto, a União tem sua fatia nos royalties reduzida de 30% para 20% já em 2012. A arrecadação dos Estados produtores – ou confrontantes, ou seja, cujo litoral está diante de campos de petróleo – cai de 26,25% para 20%. Os municípios confrontantes têm a maior redução: de 26,25% passam para 17% em 2012 e chegam a 4% em 2020. Os municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque também sofrem cortes: de 8,75% para 2%. Em contrapartida, os Estados e municípios não produtores saltam de 8,75% para 40% até 2020.
O substitutivo prevê também a redistribuição da participação especial. Neste caso, a União, mais uma vez, abre mão de parte de seus recursos. Os 50% aos quais tem direito hoje passam a ser 42% em 2012. A partir daí, com a expectativa de aumento das receitas, a União volta a ter sua alíquota ampliada ano a ano, até chegar aos 46% propostos inicialmente pelo governo.
O projeto traz perdas para os Estados produtores, que terão parcela de royalties reduzida de 26,25% para 20%. A participação especial destinada aos produtores passa, segundo o relatório, de 40% para 20%. Em 2010 o fundo especial destinou a todos os Estados R$ 160 milhões. A previsão no relatório é que até 2020 o fundo especial esteja distribuindo cerca de R$ 16 bilhões para Estados e outros R$ 16 bilhões para os municípios.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3129.
Editoria: Política.
Jornalistas: Raquel Ulhôa e Daniela Martins, de Brasília.