A decisão do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), exigindo que o veto da presidente Dilma Rousseff à mudança na repartição da receita do petróleo seja votado após os mais de 3 mil que chegaram antes causou tal revolta entre os parlamentares e confusão regimental que levou os presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), a suspender as votações deste ano nas sessões do Congresso Nacional, como o Orçamento da União para 2013 e os créditos suplementares de 2012.
"Foi uma decisão política. Não há clima nem condição política neste momento para votar qualquer outra matéria que não seja a derrubada do veto para estabelecer a distribuição dos royalties de petróleo de forma mais equilibrada", afirmou Maia, após tensa reunião com Sarney, líderes e outros parlamentares envolvidos nas negociações. Para respaldar a decisão, foi usada uma interpretação da decisão de Fux, segundo a qual a não votação dos vetos sobrestaria a pauta de votações do Congresso.
Na reunião, houve clima de revolta com o que consideraram mais uma interferência no Legislativo. Líderes analisam a apresentação de uma proposta de emenda constitucional em 2013, estabelecendo os limites das ações de cada Poder.
A não votação do veto dos royalties foi uma vitória importante para os representantes dos dois maiores Estados confrontantes com plataformas marítimas de petróleo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Eles concentram hoje a grande parte dos recursos, especialmente o Rio, e seriam os maiores perdedores com a mudança da regra atual.
Para os demais Estados – os não produtores -, cujas bancadas tinham número para derrubar o veto (maioria absoluta de cada Casa), significou uma grande derrota. "A maior da minha vida", definiu o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI). "Aceito derrota, mas não perdi pelo voto, mas por uma manobra".
Esses parlamentares, no entanto, que incluem representantes tanto da base governista quanto da oposição, não desistiram de mudar a repartição dos royalties e participações especiais (compensações financeiras pagas pelas petroleiras aos governos) dos campos atuais.
A nova frente da batalha será por meio da medida provisória que trata da destinação de recursos do petróleo para educação e aplica uma divisão mais equilibrada do dinheiro entre Estados e municípios, mas apenas para os campos não licitados. Várias emendas estão sendo preparadas. O relator indicado é o deputado petista Carlos Zarattini (SP), que já havia obtido avanços em negociação entre Estados confrontantes e os demais, quando relatou projeto anterior.
A primeira sessão do Congresso em 2013, para dar continuidade à pauta das sessões conjuntas, ficou para o dia 5 de fevereiro, quando os trabalhos legislativos forem retomados. Havia, ontem, a expectativa de que o STF tomasse nova posição, deixando as exigências de cumprimento do rito regimental para votação dos vetos para o futuro.
A presidente Dilma Rousseff saiu desgastada com sua base governista. Ficou claro que os líderes de partidos governistas não seguiram sua orientação nesse caso. Exceto aqueles de Estados confrontantes, os demais assinaram o requerimento pedindo que Sarney convocasse a sessão do Congresso para ontem, destinada à votação dos mais de 3 mil vetos.
Fux concedeu liminar a mandado de segurança proposto pelo deputado Alessandro Molon (PT-RJ), suspendendo a urgência aprovada por maioria das duas Casas para que o veto dos royalties fosse votado na frente. Mas o risco de derrubada de algum outro veto – como os do Código Florestal e do fator previdenciário – preocupava. Grupos de pressão começaram a se articular, como as bancadas da saúde, sindical, ruralista e cearense. Elas se uniram e imprimiram vários panfletos com orientações aos parlamentares sobre quais vetos devem ser derrubados. Neles, pedem para que sejam derrubados os vetos à Emenda 29; ao fator previdenciário; ao Código Florestal e à construção do segundo anel rodoviário do Ceará.
Dilma havia pedido a Sarney para não marcar a sessão, mas ele respondeu que nada podia fazer se os líderes do próprio governo estavam pedindo. As cédulas – na verdade um catálogo com 463 páginas – com as relações dos vetos chegaram ser impressas. Cada parlamentar teria de marcar na frente a opção pelo sim, não ou abstenção.
A sessão da manhã chegou a ser aberta pela vice-presidente do Congresso, deputada Rose de Freitas (PMDB-ES), e suspensa em seguida para tentativa de acordo. Uma das confusões foi causada pela exigência dos representantes do Rio de cumprimento de outros dispositivos regimentais, segundo os quais para cada uma das leis tratadas (os 3060 vetos são relativos a 205 leis) dez parlamentares poderiam se manifestar (quatro senadores e seis deputados).
Se a regra fosse cumprida, a votação poderia durar semanas. Os não produtores queriam votação em bloco dos vetos anteriores, mas parlamentares do Rio e do Espírito Santo não aceitaram. "A dúvida é como se procede em uma reunião nervosa e tumultuada ou negociamos. Mas não é possível fazer uma sessão assim. Não vou assinar embaixo disso, é uma irracionalidade", disse Rose de Freitas.
Um grupo de deputados e senadores de Estados não produtores foi ao gabinete de Sarney pedir que ele presidisse a sessão. Ele se negou, alegando não ter saúde para enfrentar uma sessão tão tumultuada. Previu que seria "achincalhado". Em sua ausência, também foi. "Quem deveria estar presidindo a sessão é quem montou esse circo", afirmou um senador do próprio partido de Sarney, referindo-se à convocação da sessão.
Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 3159.
Editoria: Política.
Jornalistas: Raquel Ulhôa, Caio Junqueira e Daniela Martins, de Brasília.