Apesar de sua ampla base de apoio parlamentar, a presidente Dilma Rousseff deve sofrer nova derrota no Congresso Nacional hoje, se for realmente votado seu veto à mudança na distribuição da receita resultante da exploração do petróleo e do gás natural (royalties mais participações especiais) em campos já licitados.
A sessão do Congresso está marcada para às 19h desta terça-feira, e os parlamentares do Rio de Janeiro e do Espírito Santo – os dois principais Estados confrontantes com plataformas de petróleo marítimas – lançarão mão de manobras regimentais para tentar evitar a votação, como apresentar requerimentos, usar a palavra o máximo possível e pedir verificação de quórum.
"Estamos pintados para a guerra. Somos minoria, mas combativa. Não será uma batalha fácil. Vamos resistir com todas as forças e, se perdermos, vamos recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF)", avisa o deputado Alessandro Molon (PT-RJ). Ele tenta convencer colegas de que outros Estados também perderão com a mudança da regra. A tentativa é praticamente inútil. O Rio recebe cerca de 80% da arrecadação com royalties e participações especiais (PE) destinada a Estados e municípios do país.
O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) insistirá na tese da inconstitucionalidade da mudança da regra, argumento usado por Dilma para o veto. "Royalty é receita originária dos Estados e não pode ser distribuída pelo Fundo de Participação dos Estados (FPE), por sua natureza indenizatória. A regra vetada afronta o direito adquirido do Rio e do Espírito Santo e o princípio do equilíbrio orçamentário, previstos na Constituição", diz.
Se a estratégia dos Estados confrontantes (também chamados de produtores) fracassar e o veto for votado, o resultado previsível será a derrubada, já que as bancadas das demais unidades federativas têm ampla maioria para garantir uma distribuição mais equilibrada dos recursos pagos por empresas aos cofres públicos. Para derrubar um veto presidencial, é necessário os votos da maioria absoluta de deputados (257) e senadores (41).
"O governo fez o que achou adequado, mantendo a regra atual. Mas o governo sabe que a decisão final cabe ao Congresso. E aqui as bancadas estão unidas e votam de acordo com os interesses dos seus Estados. Esse assunto não divide governistas e oposicionistas", afirma o senador Wellington Dias (PT-PI), líder da bancada petista no Senado.
O dispositivo vetado constava de projeto de lei de Dias, aprovado pela Câmara em 2011, que mudava os critérios de rateio dos royalties e PE arrecadados nos campos explorados no mar, inclusive os já licitados – que inclui 28% dos localizados na camada pré-sal. Foi aprovado como substitutivo do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB).
"Manter a distribuição como está hoje é conservar 82% dos recursos para o Rio. A Emenda Ibsen [dispositivo aprovado anteriormente no Congresso e vetado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva] tirava R$ 10 bilhões de uma vez do Rio. Nós propusemos uma fórmula que não vai retirar um centavo dele. O Rio apenas terá um crescimento de receita menor do que a dos outros Estados", afirma o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), um dos idealizadores da proposta e um dos articuladores dos não confrontantes.
Elaborado com dados de 2010, o projeto previa que o Fundo Especial rateado entre os 27 Estados e os municípios do país passaria dos R$ 2,3 bilhões recebidos naquele ano para R$ 8 bilhões em 2012. Os dois maiores Estados confrontantes, Rio e Espírito Santo, manteriam os ganhos de 2010 (cerca de R$ 11 bilhões). A partir de 2011, os recursos dos não confrontantes cresceriam numa proporção maior. Se o novo rateio entrar em vigor agora, a base continuará sendo 2010, o que implicará perda maior para o Espírito Santo, que teve um aumento de receita nesse período.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também presidente do Congresso, marcou a votação para terça-feira após decisão do STF suspendendo liminar concedida pelo ministro Luiz Fux, que determinava a votação em ordem cronológica dos mais de 3 mil vetos presidenciais pendentes. O impasse impediu a votação do orçamento da União para 2013, agora marcada para a mesma sessão, após a deliberação sobre o veto.
A bancada de São Paulo foi a única que sempre ficou dividida nas outras tentativas de mudar a repartição dos royalties e participações especiais. Isso porque o governo do Estado e os municípios litorâneos perdem com a mudança do rateio, mas as demais cidades ganham. Desta vez, os paulistas devem votar pela manutenção do veto de Dilma, atendendo a apelo do governador Geraldo Alckmin.
A derrubada do veto levará a uma dúvida jurídica, já Dilma editou uma medida provisória para complementar o vácuo deixado pelo veto. O alerta é do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator da MP – a mesma que destina para a educação os recursos dos campos concedidos após dezembro de 2012, destinados a Estados e municípios.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3206.
Editoria: Política.
Página: A6.
Jornalista: Raquel Ulhôa, de Brasília.