Prefeituras se voltam para seguro contra enchentes

Todo começo de ano é a mesma história. Chuvas causam inundações e deslizamentos que custam vidas e deixam prejuízos bilionários em várias regiões do Brasil. A maioria dos prejuízos econômicos, hoje, não é coberta por seguros e seus custos acabam recaindo sobre o poder público. Mas isso começa a mudar e algumas prefeituras estão em conversas com resseguradoras para transferir a elas parte do risco a que estão sujeitas.

É o caso da Prefeitura do Rio de Janeiro, que negocia com a resseguradora Swiss Re uma apólice para cobrir gastos do governo em casos de alagamento e desmoronamento, com a remoção de pessoas de áreas afetadas e de risco, realocação em abrigos, reestabelecimento de energia etc.

"É um dinheiro rápido para suprir custos emergenciais, para não ter que subir para as esferas estadual e federal [para pedir recursos]", explica Claudia Melo, gerente de relacionamento com o setor público da Swiss Re. "Estamos desenvolvendo um projeto com a Prefeitura do Rio, que ainda não está fechado [a contratação do seguro], mas também existe demanda por outras cidades em São Paulo, Santa Catarina e no próprio Estado do Rio", conta. Procurada, a Casa Civil da prefeitura carioca não comentou o projeto por estar em fase de análise.

Pela urgência da liberação dos recursos em casos de desastres naturais, o seguro indicado é o chamado "paramétrico", já conhecido do setor agrícola no país. Como o próprio nome indica, ele é baseado em parâmetros. No caso de enchentes e deslizamentos, ele é acionado automaticamente quando o volume de chuvas for maior que o estabelecido na apólice, sem a necessidade de análise de danos e coberturas (regulação de sinistros, no jargão do mercado).

Segundo Claudia, esse é um seguro que precisa ser desenhado sob medida para a necessidade e a realidade de cada região. O que inclui o orçamento disponível para o pagamento do seguro. "Se a prefeitura tem R$ 1 milhão [para desembolsar pela apólice], posso dar capacidade [teto do valor da indenização] de R$ 5 milhões. Mas se a região tiver menos ocorrências [de desastres], podemos aumentar esse valor", exemplifica.

O maior desafio desse tipo de seguro é a escassez de informações sobre as quais o seguro paramétrico é desenhado, disseram, por e-mail, Michael Huberti e Fábio Reis, subscritores de riscos de propriedade da Munich Re. Segundo eles, somente com uma base de dados histórica estatisticamente relevante é possível chegar à definição do melhor gatilho do seguro, ou seja, condição que causa o acionamento automático do seguro.

Hoje, a Munich Re vê maior perspectiva para o seguro paramétrico no Brasil para o setor privado, com o objetivo de proteger o balanço de empresas da volatilidade dos insumos naturais essenciais à manutenção de seu fluxo de caixa e rentabilidade, por exemplo.

Para tenta suprir parte das estatísticas necessárias, a Confederação Nacional das Empresas de Seguros, Previdência Privada e Capitalização (CNSeg) fechou parceria com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), do Ministério da Ciência e Tecnologia, para prover dados estatísticos sobre a incidência de chuvas para o setor de seguros. "O mercado brasileiro não estava preparado [para fazer seguro paramétrico] porque não havia dados suficientes para analisar o risco e, por isso, os resseguradores não davam cobertura", diz Jorge Hilário Gouvêa Vieira, presidente da CNSeg.

Hilário observa que a demanda por cobertura para alagamentos no Brasil é grande para riscos individuais, como seguro de automóveis. Mas apenas as classes mais altas têm hoje acesso a esse tipo de cobertura. O grupo BB Mapfre fez um levantamento do impacto das chuvas em sua carteira de seguro de automóveis, a segunda maior do setor, com participação de 15% do mercado. Durante o primeiro trimestre de 2013, as indenizações pagas totalizaram R$ 17,9 milhões, valor 35% superior ao verificado em igual período de 2012.

Segundo estudo da Swiss Re, entre 2000 e 2010 os deslizamentos de terra, transbordamentos de rios e inundações causaram, em média, 120 mortes e perdas econômicas de US$ 250 milhões (R$ 440 milhões) por ano no Brasil. Os últimos anos, porém, apresentaram uma tendência de prejuízos acima da média. Em 2010 ocorreram 450 mortes e prejuízos de US$ 950 milhões (R$ 1,7 bilhão). Segundo o estudo, é provável que a população brasileira exposta ao risco de inundações aumente de 33 milhões de pessoas para 43 milhões em 2030 e as perdas anuais subam de US$ 1,4 bilhão para US$ 4 bilhões.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3225.
Editoria: Finanças.
Página: C3.
Jornalista: Thaís Folego, de São Paulo.