Proposta do ICMS aprovada pela CAE desagrada governo

A proposta de reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) aprovada ontem pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado não desagradou apenas São Paulo e os demais Estados das regiões Sudeste e Sul, mas também ao próprio governo federal. Vários senadores e o governo garantem que "o jogo ainda não acabou" e pretendem reverter alguns pontos aprovados pela CAE, durante a votação do projeto de resolução no plenário do Senado.

Um dos pontos questionados por vários senadores é a alíquota de 12% para a Zona Franca de Manaus (ZFM), aprovada pela CAE. Uma alternativa foi apresentada pelo senador Armando Monteiro (PTB-PE) e prevê que essa alíquota seja reduzida para 9%. Outra proposta que começou a ser discutida ontem mesmo define a alíquota interestadual única de 12% para os bens de informática.

O governo, por sua vez, não aceita a decisão da CAE de estender a alíquota interestadual de 7% do ICMS para todas as operações comerciais e de serviço provenientes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O governo entende que essa alíquota só deve valer para os produtos industriais originários dessas três regiões. "É uma ampliação além do que a gente tinha concordado", disse ontem o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa.

Para tentar derrubar essa proposta aprovada pela CAE, o governo federal ameaça desistir da criação de dois fundos para compensar perdas de arrecadação com a reforma do ICMS e para promover o desenvolvimento regional. "O governo vai avaliar se vale a pena continuar com a criação dos fundos (de compensação pelas perdas com a reforma e o de desenvolvimento regional)", disse o secretário-executivo. Sem os fundos, as mudanças no ICMS travam. Para ele, a discussão não acabou ontem. "É o primeiro passo", destacou.

A CAE não apenas manteve a alíquota interestadual de 12% para a Zona Franca de Manaus e de 12% e 7% para o gás natural, criticadas por São Paulo e pelos demais Estados do Sudeste e do Sul do país, como estendeu para todas as operações comerciais e de serviço das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste a alíquota interestadual de 7% do ICMS, que no substitutivo apresentado pelo relator do projeto, senador Delcídio Amaral (PT-MS), valeria apenas para os produtos industriais e agropecuários originários dessas três regiões.

"O que estava ruim, ficou pior ainda", disse o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP). "O acordo para preservar a alíquota de 12% para a Zona Franca amarrou todas as outras alterações feitas pela CAE", analisou. O governador do Amazonas, Omar Aziz (PSD), e o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio (PSDB), estavam presentes na reunião da CAE. "É importante agora que o governo federal reflita sobre as consequências dessas mudanças para a indústria brasileira", acrescentou o senador, observando que, em sua opinião, um dos efeitos das mudanças aprovadas pela CAE "é a desindustrialização do país".

Com minoria de membros na CAE, os senadores dos Estados do Sul e do Sudeste não conseguiram aprovar nenhuma alteração que propuseram ao substitutivo apresentado pelo senador Delcídio Amaral. Por 16 votos contra nove, a CAE rejeitou a emenda, apresentada pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que propunha a redução da alíquota da ZFM dos atuais 12% para 7%.

O senador Nunes Ferreira defendeu a proposta de Suplicy com o argumento de que ninguém questiona a existência da ZFM, mas se a alíquota de 12% for mantida, o benefício tributário da Zona Franca será ampliado. "Se o Amazonas continuar com 12% e os Estados do Sul e Sudeste com 4%, a diferença será de 8 pontos percentuais e não mais de 5 pontos percentuais, o que é um diferencial muito grande", afirmou.

O argumento decisivo para manutenção da alíquota de 12% para a Zona Franca de Manaus foi apresentado pelo senador Blairo Maggi (PR-MT). Para ele, é necessário que todo o Brasil dê uma compensação aos Estados da amazônia para que eles preservem as florestas, que é o maior patrimônio do país. "A Amazônia tem que ser preservada, mas tem que ter compensação e nós precisamos olhar o Brasil como um todo", afirmou. Outros senadores usaram o mesmo argumento, dando a vitória à manutenção da alíquota de 12% para a ZFM.

O senador Armando Monteiro (PTB-PE) chegou a propor uma alíquota intermediária de 9% para a ZFM, que não chegou a ser votada, pois não constavam dos destaques que estavam em votação na CAE. Mas vários senadores defenderam que essa proposta seja formalizada e apresentada para a votação em plenário.

O senador Suplicy apresentou outra emenda, unificando a alíquota interestadual para o gás natural em 7%, mas ela foi rejeitada por 16 votos a 7. Assim, com essa decisão, a alíquota interestadual de 12% será aplicada ao gás importado da Bolívia e ao oriundo das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, incluindo o Espírito Santo, e a alíquota de 7% para o gás que sair das regiões Sul e Sudeste para as outras três regiões. Suplicy argumentou que essa diferenciação de alíquotas para o gás criará distorções, mas a maioria dos senadores entendeu que as alíquotas diferentes não darão margem à guerra fiscal, pois apenas preservarão a arrecadação dos Estados produtores.

Por proposta do senador José Agripino (DEM-RN), a CAE estendeu, por 14 votos favoráveis a 11, a alíquota interestadual de 7% do ICMS para o comércio varejista e os serviços do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Para o senador Aloysio Nunes Ferreira, a mudança vai "legalizar o passeio de notas fiscais que existe hoje".
Por último, a CAE rejeitou uma emenda da senadora Ana Amélia (PP-RS), que unificava em 7% a alíquota interestadual do ICMS para os bens de informática. A senadora disse que o objetivo de sua emenda era o de "preservar o equilíbrio competitivo entre as regiões". Mas o argumento não foi aceito pelos senadores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, pois eles entenderam que a alíquota interestadual de 12% para todos os produtos da Zona Franca de Manaus já tinha sido aprovada em votação anterior.

O secretário-executivo Nelson Barbosa disse que é preciso, pelo menos, uma semana para a área econômica avaliar o impacto financeiro da decisão de estender a alíquota de 7% para o comércio e os serviços das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Até porque, segundo ele, é preciso analisar se as mudanças feitas pela CAE desvirtuam a proposta de reforma do ICMS e se irão ou não exigir maior injeção de recursos nos fundos e se o governo está disposto a fazê-la. "Queremos mais uma semana para avaliar isso. Esse é o tempo para conversar e avaliar", frisou.

Ontem, o relator da Medida Provisória 599, senador Walter Pinheiro (PT-BA), apresentou o seu parecer que modifica o texto apresentado pelo governo. Ele mudou a composição do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que financiará os projetos de investimento. A proposta de Pinheiro prevê que metade dos R$ 296 bilhões do FDR serão injetados por meio do Orçamento da União, para transferência direta aos Estados, e a outra metade será liberada por instituições financeiras federais por meio de empréstimos aos governos estaduais e municipais.

Pouco depois da apresentação do parecer de Pinheiro, fontes do Ministério da Fazenda garantiram que o governo não concorda com a mudança na composição do FDR e que a área econômica vai insistir nas negociações para que seja mantido o texto original da MP, que prevê que 25% dos recursos do FDR sejam de origem orçamentária e 75% de financiamento.

Se a proposta da CAE for aprovada pelo plenário do Senado, o ICMS passará, até 2018, a ter três alíquotas: de 4%, 7% e 12%. A primeira será aplicada às mercadorias e serviços provenientes dos Estados das regiões Sul e Sudeste para os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A alíquota de 7% será aplicada aos bens e serviços das três regiões mais pobres destinados ao Sul e ao Sudeste. E a alíquota de 12% para a ZFM e nove áreas de livre comércio da Amazônia e o gás natural. Atualmente, as alíquotas interestaduais são de 7% e 12%.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3250.
Editoria: Política.
Página: A6.
Jornalistas: Ribamar Oliveira, Edna Simão, Yvna Sousa e Raquel Ulhôa, de Brasília.