O Senado aprovou ontem um projeto de lei que reduz a zero as alíquotas do PIS e da Cofins que incidem sobre as receitas dos serviços de transporte coletivo urbano rodoviário, metroviário, ferroviário e aquaviário de passageiros. O projeto repetiu o que estava previsto na medida provisória 617, de maio deste ano, apenas acrescentando o serviço aquaviário. Essa desoneração tributária não é uma nova renúncia de receita, pois está prevista na lei orçamentária deste ano, no valor de R$ 1,27 bilhão. Para 2014, a previsão é de renúncia de R$ 1,4 bilhão.
O que precisa ser considerado é que, se depender do Ministério da Fazenda, não haverá nova desoneração tributária para o setor de transporte coletivo, estando, assim, descartada a possibilidade de que o governo venha a isentar do PIS e da Cofins o óleo diesel utilizado pelos ônibus e a energia elétrica usada por trens, metrôs e trólebus. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já fez chegar à presidente Dilma Rousseff a avaliação de que não há espaço fiscal em 2014 para novas desonerações tributárias. Mantega e a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, estão fechando a proposta orçamentária do próximo ano.
No fim de junho, sob o calor das manifestações de rua, a presidente Dilma informou, durante reunião com 27 governadores e 26 prefeitos de capitais, que estava disposta a ampliar a desoneração do PIS-Cofins sobre o óleo diesel dos ônibus e a energia elétrica consumida por metrôs e trens. O objetivo era reduzir as tarifas do transporte coletivo, que tinham sido o estopim das manifestações populares. Pediu que os governadores e prefeitos considerassem a possibilidade de fortalecer esse processo também desonerando o diesel e a energia elétrica de seus impostos. Este foi o quarto pacto proposto por Dilma.
Governo desiste de desonerar diesel e energia elétrica
Depois dessa reunião, e sob a liderança do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) e do prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT), presidente da Frente Nacional dos Prefeitos, o Senado aprovou rapidamente o projeto de lei que institui o regime especial de incentivos para o transporte coletivo urbano de passageiros (Reitup). Este regime prevê a isenção do PIS e da Cofins incidente sobre o diesel utilizado pelos ônibus, a energia elétrica usada pelos metrôs, trens metropolitanos e trólebus, o gás natural, os chassis e carrocerias, veículos, pneus e câmaras de ar.
Os Estados e municípios que quiserem aderir ao Reitup também terão que conceder isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os mesmos produtos, além de redução ou isenção do Imposto sobre Serviços (ISS), admitida inclusive a restituição às empresas do setor.
O Reitup foi longamente discutido pelos senadores com o ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, pois, na época, o governo era favorável ao projeto. Durante as discussões, Barbosa chegou a propor que fosse estabelecida uma cota de óleo diesel para cada empresa de ônibus. Com a medida, ele esperava evitar desvios do combustível desonerado e estimular a eficiência.
Em determinado momento, no entanto, o governo desistiu do projeto e terminou baixando a MP 617, limitando a desoneração do PIS e da Cofins apenas às receitas das empresas de transporte coletivo – medida contemplada pelo projeto aprovado ontem pelo Senado. Mas a proposta do Reitup foi retomada em junho, já na ausência de Barbosa, quando a presidente se comprometeu com governadores e prefeitos a fazer a nova desoneração.
Os senadores, talvez estimulados pelo clamor das ruas, exageraram na dose. Incluíram no projeto de lei um dispositivo que prevê que os recursos efetivamente aplicados por Estados e municípios no Reitup serão descontados da parcela a ser paga mensalmente pelo serviço das dívidas renegociadas com a União. Esse desconto será feito até o limite de 30% do valor da parcela mensal.
Em outras palavras, a renúncia tributária decorrente das desonerações feitas por governadores e prefeitos será paga, pelo menos em parte, pela União. Essa medida, se aprovada pela Câmara, reduzirá o superávit primário de Estados e municípios e a própria meta fiscal do setor público consolidado. Há quem defenda, dentro do próprio governo, que este é o caminho inevitável a ser seguido no futuro, pois os governos estaduais e as prefeituras não possuem espaço fiscal que permita a desoneração do transporte coletivo. Esta poderá ser, inclusive, uma bandeira nas eleições do próximo ano.
A presidente Dilma Rousseff está sendo submetida a dois tipos de pressão no momento em que a proposta orçamentária de 2014 está sendo fechada. De um lado, a base política do governo reivindica mais gastos nas áreas de educação e saúde, com o argumento de que o Orçamento do próximo ano precisa refletir o sentimento da população que foi às ruas em junho. De outro, o Ministério da Fazenda procura mostrar que não existe espaço fiscal para a ampliação dos gastos, sem reduzir o superávit primário do setor público.
Uma ampliação dos gastos neste momento, marcado por grande instabilidade financeira, poderia ter um impacto desastroso sobre as expectativas dos agentes econômicos, argumentam os técnicos da área econômica. Para o mercado, a atual política fiscal já é excessivamente expansionista. Uma sinalização do governo de novo aumento das despesas poderá ser um passo decisivo em direção ao downgrade – um rebaixamento na classificação da dívida brasileira pelas agências internacionais de risco. O governo quer evitar que isso aconteça.
Todos estão com a atenção voltada para a proposta orçamentária de 2014 que será entregue pelo governo ao Congresso no fim deste mês. Mesmo que a execução orçamentária só seja definida em fevereiro do próximo ano, por meio do decreto de contingenciamento, o projeto de Orçamento já dará algumas indicações sobre a trajetória das receitas e das despesas. E também em quanto o governo vai reduzir a meta fiscal com o abatimento de gastos com desoneração e investimentos.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3325.
Editoria: Brasil.
Página: A2.
Jornalista: Ribamar Oliveira, de Brasília (ribamar.oliveira@valor.com.br).