O governo vem atrasando o repasse da parcela do salário educação devida a Estados e municípios. Isto ocorreu em fevereiro e em março deste ano, quando o repasse foi feito, por meio de ordem bancária, no último dia de cada um desses dois meses. Desta forma, o dinheiro só ficou disponível nos caixas estaduais e municipais no mês seguinte.
"Se não bastassem as dificuldades financeiras que estamos enfrentando, o governo ainda atrasa o dinheiro do salário educação", lamentou o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, em entrevista ao Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor.
No dia 28 de fevereiro deste ano, por meio de ordens bancárias, o governo autorizou o repasse de R$ 1,46 bilhão para Estados e municípios, referente às quotas de janeiro, conforme levantamento no Portal da Transparência feito pelo Valor PRO. Por que foram pagos no último dia de fevereiro, os recursos só ficaram disponíveis para os governos estaduais e prefeituras no mês de março. Em fevereiro de 2013, a sistemática utilizada pelo governo foi inteiramente diferente. O repasse das quotas estaduais e municipais do salário educação ocorreu no dia 19 daquele mês. Ou seja, os recursos puderam ser utilizados pelos prefeitos e governadores no mesmo mês.
Em 31 de março, também por meio de ordens bancárias, o governo autorizou o repasse de R$ 829 milhões para Estados e municípios, referentes às quotas de fevereiro, conforme o mesmo levantamento. Os recursos só se tornaram disponíveis para os governadores e prefeitos em abril. Em março de 2013 também foi diferente. A maior parte do repasse ocorreu em 18 de março, sendo que houve repasse também no dia 21, o que permitiu que os recursos ingressassem nos cofres dos Estados e municípios no mesmo mês.
O presidente da CNM disse que não sabe a razão do atraso desse repasse. "Nós encaminhamos um ofício ao secretário do Tesouro Nacional (Arno Augustin) solicitando explicações sobre essa questão", informou. "Mas até o momento não obtivemos nenhuma resposta", disse.
Ziulkoski especula que o atraso esteja relacionado com a necessidade de o governo federal fazer o superávit primário deste ano. "Penso que tem alguma coisa a ver com o superávit". Como o repasse foi feito no último dia de fevereiro e de março, ele só impacta o caixa do Tesouro no mês seguinte. Isto porque a ordem bancária emitida não libera os recursos para os Estados e municípios no mesmo dia. Mesmo que seja de forma involuntária, o atraso resultou em melhora da meta fiscal do governo federal em fevereiro e março.
Consultada pelo Valor PRO sobre o atraso dos repasses do salário educação aos Estados e municípios, a Secretaria do Tesouro Nacional informou, por meio da assessoria de imprensa do Ministério da Fazenda, que "o Ministério da Educação é o órgão responsável pela transferência desses recursos aos entes subnacionais".
A contribuição social do salário educação, prevista na Constituição, é uma fonte adicional de financiamento à educação básica pública. Ela é calculada com base na alíquota de 2,5%, incidente sobre a folha de salário das empresas. A quota estadual e municipal corresponde a dois terços do montante dos recursos arrecadados.
A lei do salário educação foi regulamentada pelo Decreto 6.003, de 2006. O decreto diz que a quota estadual e municipal será creditada mensal e automaticamente em favor das Secretarias de Educação dos Estados, do Distrito Federal e em favor dos Municípios para financiamento de programas, projetos e ações voltadas para a educação básica.
O repasse das quotas estaduais e municipais, decorrente da arrecadação recebida pelo Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE), até o dia 10 de cada mês, será efetuado até o vigésimo dia do mês do recebimento, de acordo com o decreto. O repasse das quotas, decorrente da arrecadação recebida no FNDE após o dia 10 de cada mês, será efetuado até o vigésimo dia do mês subsequente ao do recebimento.
O Valor PRO também consultou o Ministério da Educação e o FNDE sobre o atraso. A principal pergunta enviada foi sobre qual o instrumento legal em que se baseou o FNDE para atrasar o repasse das quotas municipais e estaduais. O Valor quis saber também se os governos estaduais e as prefeituras foram avisados antecipadamente sobre o atraso.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Educação respondeu as questões com apenas uma frase: "O FNDE repassa mensalmente os recursos do salário educação para Estados e municípios com base nas matrículas da educação básica de cada ente federado. A arrecadação, realizada entre o dia 10 do mês anterior e o dia 10 do mês em curso, é sempre transferida para os entes dentro do mês em curso, de acordo com a disponibilidade".
O presidente da CNM informou ainda que está ocorrendo atraso no repasse dos royalties do petróleo devido a Estados e municípios. "Eles (o governo) estão segurando tudo o que podem", afirmou o presidente da CNM. "Não sei com qual sentido". No levantamento que realizou, o Valor PRO constatou que os repasses de março referentes aos royalties do petróleo foram feitos também no último dia do mês. Esse procedimento não ocorreu em março de 2013 e nem ao longo de todo o ano passado.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3480.
Editoria: Brasil.
Página: A3.
Jornalista: Ribamar Oliveira, de Brasília.