Uma etapa importante da tramitação do projeto que muda o indexador de dívidas de Estados e municípios com a União foi superada ontem, no Senado, reduzindo o risco de que o texto retorne à Câmara dos Deputados. Em sessão conjunta das comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Assuntos Econômicos (CAE), os senadores seguiram o relator, Luiz Henrique (PMDB-SC), e rejeitaram três emendas que alterariam substancialmente a proposta.
O projeto de lei complementar 99/2013, que mexe na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), ainda precisa ser votado pelo plenário do Senado, instância em que foram apresentadas as três emendas pelo senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). Mas a matéria vai à votação apoiada em parecer que implica manter o acordo firmado entre o governo, autor da proposição original, e os deputados, no ano passado, visando reduzir os juros e, em alguns casos, também o estoque das dívidas. As emendas aprovadas até agora no Senado são apenas de ajuste de redação.
Não há prazo para essa votação final pelo Senado. A data depende de um acerto entre governadores e Palácio do Planalto. O fato de o governo ter apoiado o relatório aprovado ontem na CAE e na CCJ leva o senador Luiz Henrique a acreditar que será possível concluir a tramitação ainda no primeiro semestre do ano. "Essa votação só foi possível porque o governo da presidente Dilma honrou o compromisso que firmou com os governadores e com este relator", disse ele, vendo aí um "novo pacto federativo".
A versão do projeto mantida ontem manda que os saldos devedores de Estados e municípios frente à União sejam corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais juros de 4% ao ano ou pela Taxa Selic, o que for menor. A Taxa Selic funcionará como teto. Fruto de refinanciamentos concedidos pelo Tesouro Nacional ao entregar títulos públicos de sua emissão a credores originais, essas dívidas atualmente são corrigidas pelo Índice Geral de Preços Disponibilidade Interna (IGP-DI) mais juros de 6%, 7,5% ou 9% ao ano.
A mudança do indexador será retroativa à data de assinatura de cada contrato, o que reduzirá o saldo em alguns casos, basicamente o dos entes que pagam IGP-DI mais 9% ao ano. Se o projeto for aprovado, a União ficará autorizada a conceder desconto sobre os saldos devedores, correspondente à diferença em relação ao montante apurado com base na aplicação retroativa da Selic acumulada desde o início de cada operação.
Três governadores acompanharam pessoalmente a sessão e comemoraram a decisão da CAE e da CCJ de não acrescentar complicadores à aprovação do projeto. "Estamos fazendo justiça", disse o governador Teotonio Vilela Filho, de Alagoas, acrescentando que o custo das dívidas para os cofres estaduais e municipais atualmente é superior "ao que o BNDES cobra para financiar qualquer empresa".
O governador Raimundo Colombo, de Santa Catarina, afirmou que o Senado agiu com "competência, articulação e firmeza".
O governador Tarso Genro, do Rio Grande do Sul, lembrou que governo federal tinha trabalhado para adiar a votação de ontem, que era para ter ocorrido antes, na tentativa de evitar o rebaixamento da nota de classificação de risco de crédito atribuída ao Brasil pela agência Standard & Poor's. O fato de a nota ter baixado mesmo assim mostrou que o adiamento "foi um equívoco", disse.
De diferentes formas, os três destacaram que, ao limitar a correção das dívidas à Taxa Selic, a mudança na LRF viabilizará o reequilíbrio financeiro de Estados e municípios. Mesmo comprometendo boa parte da receita com pagamentos à União, eles viram o saldo devedor só aumentar nos últimos anos, chegando a cerca de R$ 500 bilhões em fevereiro de 2014.
O secretário de Fazenda de São Paulo, Andrea Calabi, também assistiu à sessão das comissões e comemorou a decisão, tomada em votação simbólica em poucos minutos. Ele destacou que, até 2027, aprovação do projeto não implicará redução do fluxo de pagamentos à União, baseados em percentual da receita dos entes devedores. O que haverá é um crescimento menor dos saldos e, em alguns casos, queda da dívida.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 3481.
Editoria: Política.
Página: A9.
Jornalista: Mônica Izaguirre, de Brasília.