Importação sobe até 633% onde o ICMS foi reduzido

Nos Estados brasileiros que adotaram políticas tributárias de inventivo à importação, as compras feitas no exterior cresceram muito acima da média nacional nos últimos anos. Entre 2003 e 2009, as importações brasileiras cresceram 164%, passando de US$ 48,2 bilhões para 127,6 bilhões. Estados com benefícios à importação, cresceram muito mais. Em Santa Catarina, o aumento foi de 633%, em Tocantins, de 560%, e no Mato Grosso do Sul, de 445%.

De acordo com Welber Barral, titular da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério do Desenvolvimento (MDIC), a maioria dos programas estudados pela Secex (que mapeou 18 Estados com alguma medida tributária que favorece a importação) atrela o benefício à necessidade de instalar unidades produtivas no Estado. É o caso de Tocantins. Outros são preocupantes, como o do Espírito Santo e o de Santa Catarina. Esse, diz ele, favorece o importado em detrimento da indústria local.

Tocantins adotou o Programa Prosperar em 2003. Ele prevê diferimento no pagamento do ICMS devido na importação de máquinas e equipamentos e matérias-primas para o processo industrial. O Proindústria, de 2003, também prevê redução do ICMS para 2% nas saídas de produtos dentro do Estado ou interestaduais. Segundo Iapurê Olsen, diretor de Atração e Fomento da Secretaria de Indústria e Comércio de Tocantins, o programa quer estimular a industrialização e a geração de empregos. "O nosso foco não é o aumento da importação, nem de arrecadação. O Estado é jovem e a indústria ainda é incipiente e queremos estimular a economia", explica ele.

De 2003 a 2009, as importações no Tocantins passaram de US$ 19,3 milhões para US$ 127,5 milhões, crescimento de 445%. Apesar do aumento, a balança comercial do Estado ainda é positiva. Em 2009, o Estado exportou US$ 280 milhões.

O crescimento de 445% das importações do Tocantins o colocam atrás apenas de Santa Catarina no ranking dos Estados onde a atividade cresceu de forma acentuada. O secretário Welber Barral atribui o salto ao programa Pró-Emprego. Criado em 2007 para estimular a movimentação nos portos catarinenses, a iniciativa prevê redução de alíquota de ICMS que oscila entre 25% a 17% para 3% mais 0,5% de fundo social. "O programa de Santa Catarina é extremamente preocupante e coloca o Estado como um pária da ordem federativa", critica o secretário. "O problema é que o mecanismo contempla inclusive bens de consumo, o que afeta a produção de maneira desleal", complementa Barral.

O benefício se converteu em cifras para os cofres públicos catarinenses. A arrecadação foi de R$ 217 milhões, em 2006, e deve alcançar R$ 410 milhões este ano. O perfil do programa catarinense chamou a atenção de tradings de comércio exterior. De 2007, quando foi criado, a 2009, 805 empresas entraram com pedido de ingresso no regime especial e dessas, 537 foram atendidas. Cerca de 45% delas são tradings. Em 2007, entre os dez maiores importadores do Estado, quatro eram indústrias ou agroindústrias e seis eram tradings. Neste ano, nove das dez maiores são companhias de comércio exterior.

O secretário da Fazenda catarinense, Cleverson Siewert, defende o programa e argumenta que ele não é o mais agressivo comparado ao de outros Estados. "Em alguns Estados o ICMS fica em 3%. Aqui, fica em 3,5%", diz o secretário. No Paraná, como Siewert faz referência, a lei prevê alíquota de 3% para matérias-primas e material intermediário ou secundário, inclusive de embalagem, usado no processo produtivo da indústria local.

Para Siewert, o programa catarinense foi potencializado pela infraestrutura portuária. São quatro portos em operação em uma costa de cerca de 500 km e um quinto deve começar a operar em 2011.

Segundo o secretário, o Pró-Emprego deve passar por uma revisão. Há dois meses, um grupo de estudo foi montado na Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc) para avaliar que setores produtivos locais estariam sendo prejudicados pelo programa estadual. O Pró-Emprego prevê proteção para vidros, espelhos, zíperes e componentes, cristais e porcelanas e, desde abril, embarcações de lazer de até 60 pés. "O programa pode passar por uma revisão. A economia é dinâmica e faz todo o sentido debater", reconhece o secretário catarinense.

O Pró-Emprego não passou por aprovação no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Segundo o coordenador do Conselho, Carlos Santana, há uma inclinação do órgão a não aprovar políticas de redução de ICMS para estímulo à importação. Ele não sabe confirmar, no entanto, quais leis tiveram aval do órgão na relação de 18 Estados que concedem algum tipo de benefício à importação, segundo o levantamento da Secex.

Segundo Santana, as leis são criadas pelos Estados com o objetivo de aumentar a arrecadação e corrigir distorções nos repasses federais. Apesar da competição que a entrada de mercadorias importadas com benefícios acaba gerando para os produtos nacionais, o secretário acredita que a questão só poderá ser contornada com uma reforma tributária que estabeleça critérios mais equânimes para a distribuição do bolo de tributos entre os Estados.

No Espírito Santo, o Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias (Fundap) está em operação desde 1970. Segundo Barral é o mais antigo benefício em operação no país. O programa capixaba prevê a utilização de recursos do Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) no financiamento do pagamento de ICMS ao Estado. A alíquota é de 12% e o financiamento pode chegar a 8% do valor de venda das mercadorias importadas, com carência de cinco anos para o pagamento e amortização de 20 anos, o que chega ao total de 25 anos. O encargo é de 1% ao ano, sem correção monetária.

Para conquistar o benefício, a empresa precisa ter sede no Espírito Santo. O Fundap prevê proteção ao que chama de "produtos tradicionais de intercâmbio comercial com o exterior", como café, cacau, madeira e trigo. Em 2007, o Espírito Santo complementou o seu programa de estímulo ao comércio exterior com o Invest-ES. O projeto prevê o diferimento de ICMS na importação de máquinas e equipamentos e matérias-primas, com prazo máximo de 12 anos para pagamento.

Segundo Barral, a pressão de associações empresariais para rever os benefícios concedidos pelo Espírito Santo fará o Estado rever a sistemática de concessão de créditos. O governo do Espírito Santo não atendeu ao Valor. O Mato Grosso do Sul, cujas importações também cresceram muito acima da média nos últimos anos, também não atendeu a reportagem.

Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2612.
Editoria: Brasil.
Página: A3.
Jornalista: Júlia Pitthan, de Florianópolis.