Os desafios do Samu no Vale

O quadro de médicos está incompleto. Apenas 19 deles ocupam as 27 vagas disponíveis para a central de Blumenau, explica a coordenadora Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva.

– Dois problemas ajudam neste déficit: o primeiro é que acredito que muitos profissionais desconhecem o tipo de trabalho e, por isso, não procuram as vagas em aberto. O segundo, é que o tempo de contratação é de apenas dois anos – diz a coordenadora.

Para o médico e presidente da Unimed Blumenau, Jauro Soares, a falta de procura se deve ao perfil do trabalho. Ele acredita que muitos médicos não se enquadram no tipo de atendimento feito no Samu e por isso as vagas não são preenchidas.

– Acho que não é nem por uma questão de salário ou coisa assim. Alguns médicos preferem o atendimento em consultório, outros, como eu, gostam de fazer cirurgia. O perfil do Samu é diferente e, por isso, talvez não seja muito atrativo – comenta Soares.

De todas as dificuldades, a que parece não ter solução são os trotes para o telefone de emergência 192. Eles vão desde piadas contadas por crianças – a maioria registrados em saídas do horário escolar – até adultos que simulam ocorrências, onde a ambulância é deslocada.

– É um absurdo que alguém faça uma coisa dessas. Isso gera um desgaste de pessoal e material. Quando alguém faz algo contra uma instituição, como o Samu, não sabem que isso vai contra elas também – lembra a coordenadora.

OS OBSTÁCULOS DO SAMU

– Entendimento do público: a maior parte da população ainda desconhece os serviços de urgência feitos pelo atendimento 192. Cartilhas e palestras foram as estratégias encontradas para melhorar o diálogo com a população.

– Veículos: a vinda de três novas unidades básicas para a regional do Vale do Itajaí deve reforçar o quadro das 13 unidades já existentes.

– Trotes: talvez o desafio mais complexo. Para quem pratica a brincadeira de mau gosto, fica o alerta: criar uma ocorrência falsa é crime. Segundo os artigos 266 e 340, do Código Penal, o ato pode gerar multa ou detenção de um a seis meses ou de um a três anos.

Samu em cartilha

Um projeto sobre o que é e o que faz o Samu será lançado hoje durante as comemorações dos cinco anos de implantação do serviço na cidade. Uma parceria tornou possível a confecção de 10 mil cartilhas que serão entregues, inicialmente, em escolas. A FJR Comunicação Integrada desenvolveu o projeto gráfico das cartilhas, patrocinadas pela Hering.

Assim que foi instalado em Blumenau, panfletos explicando o que era o serviço foram distribuídos pela cidade. Porém, a coordenadora do Samu, Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva, lembra que o material era muito técnico e acabou não sendo atrativo à população. Com a nova campanha, ela acredita que as pessoas terão uma melhor compreensão do serviço:

– O panfleto antigo não era bonito graficamente e tinha um teor muito técnico. Este novo é mais informativo, de fácil leitura e atrativo.

Às 14h de hoje, o Samu fará uma Simulação de Atendimento Integrado com helicóptero no Parque Ramiro Ruediger.

Início

Ele foi apedrejado, mal interpretado, passou por dificuldades, mas atendeu a 220 mil chamados em cinco anos de existência, completados hoje. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) do Vale do Itajaí, com sede em Blumenau, já fez mais de 90 mil remoções de pacientes graves. É um serviço de saúde responsável pela regulação dos atendimentos de urgência, porém boa parte da população ainda desconhece quais são estes serviços.

Para a coordenadora, Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva, o propósito do atendimento já é mais aceito pela comunidade. Isso inclui a não comparação com o atendimento dos Bombeiros. O Samu atende a emergências clínicas que precisem de um médico, como infartos e desmaios, por exemplo. A médica considera que hoje o serviço está consolidado.

– Exige tempo para mudar uma filosofia, mas estamos conseguindo isso aos poucos. Já mudou muito desde que entrei aqui, em 2006 – explica Beatriz.

O atendimento não se restringe somente às ambulâncias. Antes mesmo do veículo sair, o usuário que faz o chamado é atendido por um médico regulador, da central de atendimento. No início, a Central de Blumenau abrangia também o Litoral. Eram 45 municípios e 1,45 milhão de habitantes. Em 2008, o desmembramento da região litorânea fez com que fosse criado o Samu Vale do Itajaí, com atendimento a 39 cidades e 800 mil habitantes.

A falta de conhecimento dos moradores sobre o que era o Samu não foi o único problema enfrentado nestes cinco anos. Diversos episódios envolvendo a falta de ambulâncias foram flagrados. Algumas chegaram a ser apedrejadas por moradores revoltados com a demora no atendimento. Além disso, a falta de profissionais quase comprometeu o serviço.

Consolidação

Nem só de problemas vive o Samu. Foi graças ao serviço dele que Senhorinha Ferraz, 58 anos, está viva. Em outubro de 2010, a moradora da Itoupava Central perdeu a sensibilidade de um dos braços. Ficou preocupada, mas acabou passando uma noite inteira assim. Na manhã seguinte, Senhorinha resolveu pedir ajuda e ligou direto para o número 192. O atendimento foi imediato:

– Em 15 minutos eles estavam aqui e me levaram para o hospital. Tive uma fibrilação arterial. Se não tivessem me buscado em tempo, poderia ter que amputar um braço ou até morrido.

Com um pouco de timidez, Senhorinha diz que tudo deu certo porque aceitou que o Samu a levasse ao hospital. O atendimento é reconhecido em poucas palavras:

– Tenho muita gratidão pelo que eles fizeram por mim.

Nem só de problemas vive o Samu. Foi graças ao serviço dele que Senhorinha Ferraz, 58 anos, está viva. FOTO: JANDYR NASCIMENTO.

 "No desespero, as pessoas perdem a noção do tempo"

Entrevista: Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva, coordenadora

Entrevista: Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva, coordenadora

A história do Samu e da médica Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva são praticamente uma só nestes cinco anos. Foi ela quem fez o primeiro plantão do Samu e há três anos coordena o serviço. Já enfrentou diversas situações de reclamações, mas afirma que neste tempo o Samu não sofreu nenhum processo.

Jornal de Santa Catarina – O que mudou nestes cinco anos?

Maria Beatriz Silveira Schmitt Silva – O que mais mudou foi o entendimento da população em relação ao que é o Samu. No começo tínhamos uma dificuldade enorme, pois as pessoas achavam que o atendimento era o mesmo que o dos Bombeiros. Hoje, a situação já está melhor.

Santa – As reclamações sobre a demora ou a falta de atendimento vez ou outra estão na mídia. O Samu falhou em algum momento?

Maria Beatriz – Nestes cinco anos não tivemos um processo sequer. Verifico todas as queixas pessoalmente e dou um retorno a quem as fez. Todo nosso atendimento é gravado, desde a primeira conversa até a entrega do paciente no hospital feita pela ambulância. No momento do desespero, as pessoas perdem a noção do tempo e acabam reclamando da demora, mas quando mostro todo o processo elas se acalmam e concordam com o procedimento.

Santa – O que você espera para o futuro do Samu?

Maria Beatriz – Acredito que as pessoas vão cada vez mais entender para que serve o Samu. Uma mudança futura, que está sendo estudada, é em relação à mudança da nossa central de atendimento do 10º Batalhão da Polícia Militar para o prédio da Secretaria de Desenvolvimento Regional (SDR). Em 2008, durante a catástrofe, fomos atingidos pela enxurrada. Precisamos ter um lugar de melhor acesso em caso de um novo episódio. Espero ainda que mude a forma de contratação dos profissionais. Se isso não acontecer, em maio não poderei mais ficar aqui. Eles já estudam um projeto em relação ao assunto. Acredito que mudanças poderão ocorrer.


Santa – Qual a situação mais difícil enfrentada até hoje?

Maria Beatriz – Sem dúvida nenhuma foi a tragédia de 2008. Pela situação, pelas ocorrências, pelo cansaço dos nossos profissionais, que trabalharam semanas e semanas. A lembrança daqueles dias vai ficar para o resto da minha vida.

Veículo: Jornal de Santa Catarina.
Edição: 12146.
Editoria: Geral.
Página: 10.
Jornalista: Tatiana Santos (tatiana.santos@santa.com.br).