Há mais uma proposta na mesa de discussão do turbulento debate em torno do Código Florestal. Um grupo de 30 empresas majoritariamente do setor de papel e celulose e outro formado por 34 organizações não governamentais divulgou ontem um conjunto de 16 pontos que, esperam os signatários, pode destravar o processo e reduzir a polarização que opõe ruralistas a ambientalistas. O maior diferencial da iniciativa é incluir a vertente da mudança climática e da prestação de serviços ambientais modernizando o debate.
O Código Florestal em vigor é de 1965, e evidentemente, não incorporava estes conceitos. O ponto 13 da proposta, por exemplo, diz que a recuperação das Áreas de Proteção Permanente (APP) e Reserva Legal (RL) que foram desmatadas até 21 de julho de 2008 podem candidatar-se ao mercado brasileiro de carbono, assim como ter acesso aos mercados internacionais "de acordo com suas regras específicas". Trata-se de antigo lobby do setor de papel e celulose, que argumenta que suas florestas plantadas sequestram carbono da atmosfera e, portanto, podem contabilizar créditos. "Quisemos colocar inovações que apontem para o futuro", diz Beto Mesquita, diretor do Instituto BioAtlântica (IBio), um dos articuladores da proposta que nasceu dentro do Diálogo Florestal, iniciativa que desde 2005 coloca na mesa representantes de ONGs e de empresas florestais.
Há sugestões, também, para contornar grandes problemas. Pela proposta, quem manteve a área de RL de acordo com a legislação em vigor "à época da supressão" não precisa recompor ou compensar para os limites atuais. É uma forma de resolver a polêmica em torno à anistia e à moratória ao desmatamento presentes no controverso relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que está no Congresso para ser votado – e que pode premiar desmatadores e punir quem cumpriu a legislação.
Em topos de morro e declives acentuados já desmatados, a ideia é considerar estas áreas como protegidas, mas permitir o cultivo de árvores. " O manejo garante cobertura permanente e evita a erosão das encostas", explica Ana Cristina Fialho de Barros, da TNC.
Para recompor áreas de Reserva Legal, a sugestão é criar mecanismos que permitam fazer a compensação em outro lugar, desde que no mesmo bioma. "Queremos colocar o Código no século 21", diz Roberto Smeraldi, da Amigos da Terra-Amazônia Brasileira. "Para o investidor é importante ter segurança jurídica e previsibilidade", diz Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano Papel e Celulose.
O documento já foi entregue nos ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Desenvolvimento Agrário e a parlamentares. É assinado por Suzano, Fibria, Stora Enso, Klabin e outras grandes do setor, e por WWF, ISA, IPAM, Imazon, TNC e CI, para citar algumas das ONGs. O Greenpeace não assina. "O que pegou foi que não se fala em desmatamento zero", explica Rafael Cruz, coordenador do Greenpeace para Código Florestal. Segundo alguns estudos, cita, a edição atual do Código autorizaria a retirada de mais 100 milhões de hectares. "Compare isto com o tanto de floresta que o país já perdeu. Desmatamento zero tem que ser ponto de partida em qualquer conversa sobre Código Florestal." O outro ponto que desagrada o Greenpeace foi o processo de articulação. "Os movimentos sociais não estão contemplados, nem as entidades que representam os pequenos agricultores", diz Cruz. Os signatários discordam e garantem que todos foram ouvidos.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2722.
Editoria: Política.
Página: A9.
Jornalista: Daniela Chiaretti, de São Paulo.