A Medida Provisória 529, assinada pela presidente Dilma Rousseff há duas semanas, está causando apreensão nos especialistas em Previdência Social. A MP reduz de 11% para 5% a contribuição previdenciária oficial para os microempreendedores individuais (MEI), como um estímulo para que os trabalhadores deixem a informalidade. O receio de especialistas é que a facilidade de criação de um CNPJ para se tornar microempreendedor individual leve trabalhadores que não teriam direito ao benefício a migrar para o novo modelo, provocando um desequilíbrio nas contas da seguridade.
O Programa Microempreendedor Individual, lançado em 2009, permite que trabalhadores que se encontram na informalidade consigam obter um CNPJ para ter acesso ao crédito, a benefícios fiscais concedidos pelo governo e possam entrar nas estatísticas do mercado de trabalho. Pela legislação atual, os trabalhadores teriam de contribuir com 11% do salário mínimo para os cofres da Previdência Social se quiserem ter direito à aposentadoria. A MP 529 reduziu essa alíquota. Até o momento o governo conseguiu a formalização de 1 milhão de novos empreendedores individuais.
Os técnicos especialistas em previdência, alertam, contudo, para existência de alguns problemas: os trabalhadores autônomos, que contribuem com a Previdência pelo Recibo de Pagamento de Autônomo (RPA), continuam tendo de pagar 20% aos cofres da Previdência. Se eles quiserem abrir mão da aposentadoria por tempo de serviço, optam por uma contribuição menor – 11%. Dados oficiais mostram que, em 2009, havia mais de 4 milhões de contribuintes enquadrados nessa categoria.
Não existe também isonomia de tratamento na nova regra com a situação das empregadas domésticas e dos facultativos – pessoas que já tiveram algum vínculo empregatício anterior e estão desempregados no momento ou aquelas que, sem nunca terem contribuído com a Previdência, querem, a partir de um determinado momento, passar a contribuir para ter o benefício no futuro.
No caso das empregadas domésticas, o desconto para o INSS é de 20% – 12% custeado pelo empregador e 8% descontado do vencimento da trabalhadora. Os facultativos são obrigados a pagar 11% para os cofres públicos – ou 20%, se quiserem se aposentar por tempo de serviço. Segundo a Previdência Social, havia (dados também de 2009) 740 mil empregados domésticos e 670 mil facultativos em todo o país.
Embora não estejam enquadrados nas regras que definem que pode ou não ser microempreendedor individual, esses trabalhadores tenderão a migrar para o novo modelo. Basta acessar o portal do empreendedor na internet e cadastrar-se que um CNPJ será emitido quase instantaneamente. A mesma situação aconteceria nos casos de trabalhadores de estabelecimentos comerciais. Patrões interessados em pagar menos para a Previdência poderiam, segundo especialistas consultados, estimular seus empregados a migrarem para o novo modelo, descontando um percentual menor para o INSS. Para o empregador, fica a vantagem de não ter que pagar férias proporcionais, a parcela patronal do INSS do patrão e 13º salário
O temor que surge entre os técnicos do governo é de que esse grupo beneficiado pela nova legislação venha a produzir nas contas da Previdência o mesmo desequilíbrio que representam, hoje, os trabalhadores rurais, incluídos após a Constituição Federal de 1988 sem que tivessem contribuído para receber o benefício da aposentadoria. "O MEI poderá deixar de ser um benefício e passar a ser assistência social daqui a uma década", receiam esses técnicos.
Veículo: Jornal Valor Econômico.
Edição: 2740.
Editoria: Brasil.
Página: A2.
Jornalista: Paulo de Tarso Lyra, de São Paulo.